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Brasília Rural: ainda há muito o que se conhecer

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A agricultura familiar e camponesa pode ser encontrada por todo o Distrito Federal - Foto: Andre Borges/Agência Brasília
Brasília não pode ser vista somente por seus monumentos

Em 2020, a comemoração dos 60 anos de Brasília ficou em segundo plano devido aos efeitos da pandemia da covid-19. Sempre que celebramos o aniversário da capital federal é comum ressaltarmos as belezas da sua arquitetura, dos benefícios da cidade planejada e a riqueza da sua população composta por brasileiros de diversas regiões. 

Como professor de Geografia sempre tento lembrar que Brasília não pode ser vista somente por seus monumentos. Apesar das suas singularidades, temos uma cidade que possui a complexidade de qualquer outra grande metrópole, principalmente no país em que vivemos, cuja marca é a extrema desigualdade social. 

Outra lembrança não menos importante é destacar também que Brasília não é só urbana. Afinal, como diz um conhecido lema dos movimentos sociais de base rural: se o campo não planta a cidade não janta!

A população brasiliense precisa conhecer mais e igualmente a sexagenária Brasília rural. Não seria exagerado afirmar que as áreas rurais que compõem o quadradinho possuem uma história muito mais longeva que os sessenta anos oficiais. Uma prova inconteste do passado rural é a própria toponímia, ou seja, o nome que atribuímos a determinadas localidades. O nome de algumas regiões administrativas têm origem em antigas fazendas goianas, a exemplo das regiões do Gama, Taguatinga, Riacho Fundo, Santa Maria, Vicente Pires, Sobradinho e Paranoá. 

Nos primeiros artigos da minha coluna pretendo apresentar algumas características dos espaços rurais de Brasília para que possamos compreender a expressividade do seu território, quantos são seus moradores e seu perfil, o que produzem, qual sua importância econômica, o que os seus moradores  demandam e quais são os desafios para a Brasília Rural. 

Dou início a essa breve apresentação com algumas informações importantes. No ano de 2010, data de realização do último censo demográfico do IBGE, Brasília possuía 2.570.160 habitantes sendo que 97% deles residiam em perímetro urbano e somente 3% em áreas rurais. 

Se em termos de população os espaços rurais congregam um reduzido número de habitantes, quando mencionamos a representatividade em área essa realidade se inverte. 

De acordo com o Plano de Ordenamento Territorial (PDOT), 70% do território do Distrito Federal é constituído por áreas rurais, classificadas como zona rural de uso controlado e zona rural de uso diversificado. Nessas áreas podemos encontrar residências, agroindústrias, cooperativas, assentamentos rurais, parques naturais, fazendas, hotéis e uma rica e diversa produção de alimentos que abastecem a cidade. 

Os números divulgados pela produção agrícola municipal do IBGE (2019) mostram que o total em hectares da área plantada ou destinada à colheita de produtos das lavouras temporárias e permanentes em Brasília  foi de 165.445 ha. As culturas de soja e milho são as que ocupam maior quantidade de área, representando 84% do total de 30 produtos registrados na pesquisa.

O destaque para os grãos é um indicativo de que em Brasília se produz tanto culturas da cesta básica como também commodities internacionais. Dado esse que revela a integração com os mercados globais.

E como essa produção está distribuída espacialmente? O que se observa é que os produtos do chamado agronegócio, localizam-se nas porções nordeste e sudeste do quadradinho, mais precisamente nas áreas inseridas nas bacias dos rios Preto e São Marcos. Nessas áreas, é possível verificar a presença de uma agricultura moderna com produção em grande escala, utilização de maquinário, tecnologias de irrigação, acesso à crédito e comercialização com o mercado externo.

A agricultura familiar e camponesa pode ser encontrada por todo o Distrito Federal com destaque para as porções noroeste e sudoeste. Fazem parte desse grupo assentados e acampados da reforma agrária de movimentos sociais, com destaque para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); pequenos produtores individuais em sítios, chácaras e agrovilas; trabalhadores integrados em cooperativas de produção e; praticantes da agricultura urbana e periurbana.

Com essa pluralidade de usos do território quero provocar os leitores a pensar que o rural é muito mais do que o espaço destinado à produção agropecuária. Mais do que isso, os espaços rurais são fundamentais para a existência e reprodução da sociedade, seja por sua centralidade enquanto local de produção de alimentos, seja pelo seu potencial em criar formas novas e sustentáveis de relação com a natureza. É também nesses espaços que se constroem relações de solidariedade, de troca de conhecimentos e de preservação da cultura de um povo. 

Como vimos neste primeiro artigo sobre a Brasília Rural, há muito ainda que se conhecer e no próximo artigo da coluna pretendo explorar mais acerca dos moradores das áreas rurais.

*Juscelino Bezerra é geógrafo, doutor em Geografia e professor na Universidade de Brasília

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.

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Edição: Flávia Quirino