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Lawfare

Parlamentares entregam carta a embaixador de El Salvador para pedir liberdade de Vanda Pignato

Ex-primeira-dama do país centro-americano está há três anos em prisão domiciliar

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Brasileira, a ex-primeira-dama de El Salvador, Vanda Pignato, está há mais de três anos cumprindo prisão domiciliar no país da América Central - Reprodução/Twitter

Um grupo de deputados federais e representantes de entidades da sociedade civil brasileira se reuniram nesta terça-feira (16), em Brasília, com o embaixador de El Salvador no Brasil, Victor Lagos Pizzati, para entregar uma carta em defesa da liberdade da ativista política Vanda Pignato, ex-primeira-dama do país da América Central, que está há pouco mais de três anos em prisão domiciliar.

Brasileira, mas naturalizada salvadorenha, Vanda sofre restrição de liberdade desde 2018, quando chegou a ser presa no contexto de um processo judicial por suposta corrupção e lavagem de dinheiro no valor US$ 165 mil, ocorrida durante o mandato de Maurício Funes, da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), o primeiro presidente de esquerda eleito no país, que governou entre 2009 e 2014. 

O caso, que ficou conhecido no país como Saqueo Público (pilhagem pública, em espanhol), envolve um suposto esquema que teria desviado US$ 351 milhões dos cofres públicos do país.

Além do ex-presidente, auxiliares e outros familiares de Funes, incluindo filhos, foram acusados na Justiça. Maurício Funes governou o país por seis anos e saiu com ampla aprovação popular, tendo ajudado a eleger o seu sucesso, Salvador Sánchez Cerén, que governou até 2019.

Os processos judiciais em El Salvador têm muita similaridade com a Operação Lava-Jato, que terminou tendo as ações judiciais contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), incluindo a declaração de suspeição do ex-juiz Sergio Moro nos casos, durante o período em que esteve à frente da Operação na Justiça Federal, em Curitiba.  


Deputado Paulo Teixeira (PT-SP) cumprimenta embaixador de El Salvador, Victor Lagos Pizzati, durante entrega de carta em defesa da liberdade de Vanda Pignato / Gustavo Bezerra/Partido do Trabalhadores (PT)

A carta entregue ao embaixador é assinada pelos deputados Paulo Teixeira (PT-SP) e as deputadas Lídice da Mata (PSB-BA), Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Talíria Petrone (PSOL-RJ), além da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

Eles argumentam que a ex-primeira-dama, assim como Lula, é vítima de lawfare, termo em inglês que significa o uso de instituições jurídicas, de forma abusiva, para perseguir adversários políticos. No documento, os parlamentares e as entidades manifestam preocupação com a situação pessoal, processual e de saúde de Pignato.

Quando foi presa, em 2018, a ex-primeira-dama estava hospitalizada por causa de uma doença renal e, desde então, vem se tratando de um grave câncer. "[Vanda Pignato] é vítima de um procedimento judicial iníquo e de inegável conteúdo persecutório, cuja tramitação é irregular, dado que, superados todos os prazos legais, tais ações não vão a juízo", diz um trecho da carta. Ela já foi absolvida na esfera cível, mas segue enfrentando um outro processo pelos mesmos motivos. 

Em entrevista concedida ao jornalista Juca Kfouri e exibida pela Rede TVT, em abril deste ano, Vanda Pignato comentou sobre os processos que responde no país. 

"Sabe qual é a prova que eles apresentavam? Eles diziam que meus cartões de crédito foram pagos pelo Maurício [Funes, ex-presidente], meu então esposo. Quando Maurício foi candidato, ele deixou de trabalhar e só eu trabalhava. Então, eu gastei muito em cartão de crédito, mas eu não gastei em sapato e carteira, era supermercado, dry clean, coisas assim. Essa dívida ficou e quando o Maurício ganhou, ele começou a pagar com o cheque do salário dele. Metade com o salário e metade em dinheiro. E aí a Justiça disse que isso era enriquecimento ilícito, e eu ganhei esse processo, fui absolvida. E aí, depois, me acusaram de lavagem de dinheiro pelos mesmos fatos que me incriminavam em enriquecimento ilícito. Uma pessoa não pode ser julgada duas vezes pela mesma coisa", afirmou, na ocasião. A audiência mais recente sobre o caso ocorreu no fim do mês passado

Na carta dos parlamentares brasileiros, eles enfatizam ainda o que consideram uma situação de insegurança jurídica de Vanda Pignato, por causa de um processo que se arrasta por anos sem um desfecho. 

"Estes juízos, ademais de referir-se e fatos pelos quais dra. Vanda Pignato já foi devidamente absolvida em âmbito cível, têm sido permanentemente prorrogados, excedendo todos os prazos fixados em leu, inclusive pelos próprios juízes das causas, que são sistematicamente substituídos ao se aproximarem da data dos respectivos julgamentos, mantendo0se desse modo Vanda Pignato em profunda insegurança jurídica, prolongando-se indefinidamente sua restrição de liberdade, além de agravar ainda mais seu estado de saúde".

Segundo relatos de participantes da reunião, o embaixador Pizzati afirmou que conhece pessoalmente Vanda Pignato, e que sempre teve um grande respeito pelo seu trabalho como Secretária de Inclusão Social do país. "Ele disse que ficou muito chocado quando soube dos processos contra ela na justiça salvadorenha e que ficou aliviado quando soube que ela poderia cumprir prisão domiciliar, condição  que outras pessoas, também com processos na justiça, não puderam ter acesso", afirmou Paulo Maldos, da Comissão Brasileira Justiça e Paz, vinculada à CNBB.

O embaixador também teria se comprometido a encaminhar a carta e as preocupações apresentadas pelos parlamentares e entidades ao governo de El Salvador. O país é presidido atualmente pelo ultraconservador Nayib Bukele, Grande Aliança pela Unidade Nacional (GANA).

Recentemente, a Assembleia Nacional do país, controlada por apoiadores do presidente, destituiu cinco juízes da Suprema Corte do país, além do procurador-geral de Justiça, substituindo-os por nomes alinhados ao governo. Por causa desses movimentos, entidades de direitos humanos em El Salvador acusam o presidente de concentrar poderes e ameaçar a estabilidade democrática do país. 

Perfil 

Militante histórica do Partido dos Trabalhadores, Vanda Pignato é formada em direito e atua como ativista de direitos humanos, tanto no Brasil como na América Latina, desde a adolescência. Em 1992, mudou-se para El Salvador e lá, até 2009, foi diretora do Centro de Estudos Brasileiros na Embaixada do Brasil.

De 2009 a 2014, já como primeira-dama, assumiu a Secretaria de Inclusão Social da Presidência da República de El Salvador e foi também presidenta do Instituto Salvadorenho de Desenvolvimento da Mulher (ISDEMU) no governo de Maurício Funes. Depois, seguiu nas mesmas funções no governo de Salvador Sánchez Cerén.

Durante sua gestão, Vanda Pignato criou e implementou em todo o país o Programa Ciudad Mujer (Cidade Mulher), reconhecido como modelo de políticas públicas de gênero por organismos internacionais e principalmente, e considerado uma unanimidade entre as mulheres salvadorenhas. A ex-primeira-dama e secretária de governo também articulou leis e medidas de proteção à mulher, à população idosa e contra todas diferentes discriminação com base no gênero e orientação sexual. 

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Edição: Flávia Quirino