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Carnaval sem Carnaval

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"Brasília ainda é uma cidade jovem. Pode recuperar as suas fantasias e bordar novos sonhos de ocupação da cidade". - Foto:Toninho Tavares/Agência Brasilia
O carnaval é a celebração das cidadanias negadas, é a subversão dos humilhados pelo riso, pela troça

Mais um ano sem carnaval no Brasil e alguns de nós encaram fevereiro numa tristeza profunda, ficando só na lembrança de outros carnavais. Me incluo nessa.

Não falo dos carnavais privados, dos camarotes VIPs e dos compradores de abadás. Essas são festas como outras festas no ano. É do carnaval de rua, da festa de Baco e Exu, do esquecimento necessário por cinco dias do sofrer diário anual, do encantamento dos corpos na quizomba do mundo, dos que se jogam na rua sem medo de seus semelhantes. Suados, doloridos, embriagados, chapados, sujos, cansados, porém felizes. É uma energia inexplicável, diferente de qualquer outra festa.

O carnaval é a celebração das cidadanias negadas, é a subversão dos humilhados pelo riso, pela troça. É um momento único no calendário brasileiro, e eu diria mundial. É depois do carnaval que o ano realmente começa no Brasil. Com a pandemia, parece que o ano não começou depois da virada para 2021.

Não me entenda mal, ninguém é obrigado a gostar do carnaval. E não é todo mundo que cai de corpo e alma na festa. Agora ninguém precisa odiá-la para se sentir superior, ou combatê-la como um evento do próprio Satanás.

Quem não gosta do Natal, não sai por aí fazendo campanha contra a decoração na época. Mas parece que reprimir o carnaval é parte da agenda de alguns grupos evangélicos e conservadores. A Secretaria de Segurança Pública do DF anunciou antes do feriado, que estava proibida inclusive a presença de pessoas fantasiadas nos bares e nas ruas.

Governador Ibaneis, o carnaval não existe só para dar lucro e milhões para a cidade, não é a festa dos “vagabundos”, é a festa do povo, de quem trabalha o ano inteiro e ainda bota arroz e feijão na mesa de muita gente trabalhadora. A proibição das grandes aglomerações neste período pandêmico de hospitais lotados eu entendo, tem base na ciência, mas multar gente fantasiada na rua? O que há por trás do discurso técnico e científico, Governador, a higienização da cidade?

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Não é de hoje que o carnaval é perseguido e reprimido nas ruas de Brasília. É também um conflito pelo sentido do espaço público. Pelo controle dos corpos e das ruas. A proibição legal, as bombas de gás lacrimogênio, o spray de pimenta na cara, o cassetete no lombo, são parte cotidiana nas aglomerações do feriado na capital. Da periferia ao centro. Desde os grandes blocos nos trios elétricos aos bloquinhos nos becos do Setor Comercial Sul.

Mas Brasília ainda é uma cidade jovem. Pode recuperar as suas fantasias e bordar novos sonhos de ocupação da cidade. O carnaval que vier após a superação da pandemia, virá com força. E a força do movimento cultural da cidade pode reinventar o festejo na rua e reconstruir as tradições, como em Belo Horizonte na última década.

Talvez Brasília um dia seja conhecida além de suas máscaras, de suas disputas de poder, pelo poder de festejar e celebrar a vida.

Carnavalizar a cidade é preciso.

*Diego Ruas é escritor, designer e engenheiro florestal.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

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Edição: Flávia Quirino