Com mais de um terço da população em situação de insegurança alimentar e desemprego atingindo 15,8% da população economicamente ativa, o Distrito Federal vive uma crise sem precedentes no setor de assistência social.
O ápice dessa situação foi marcado por uma morte tragicamente simbólica, que completou pouco mais de um mês na última semana. Janaína Nunes, de 44 anos de idade, perdeu a vida enquanto aguardava, de forma humilhante, atendimento na fila do Centro de Referência em Assistência Social (Cras) do Paranoá, região administrativa do DF.
:: "Quem reclama da fila do CRAS tem que agradecer", diz governador do DF em convenção ::
O incidente ocorreu no dia 17 de agosto e gerou grande repercussão em Brasília. As filas do Cras já se arrastavam há meses e era o retrato mais visível do caos vivido pela área, que lida com políticas públicas justamente para a população mais vulnerável.
:: Após morrer na fila do Cras, Janaína Nunes ainda levou uma semana para ser sepultada ::
Somente depois da morte de uma pessoa na fila, o Governo do DF (GDF) decidiu parar com o esquema de filas e retomar os agendamentos, que era uma demanda dos técnicos que atuam no setor.
"O governo desistiu do atendimento como estava, por meio de filas, e voltaram com os agendamentos prévios. O que é menos pior porque evita de deixar as pessoas expostas. Mas isso só ocorreu depois que aquela senhora faleceu. E os servidores alertaram desde o começo que essas filas só dariam problema", aponta Natalícia Santana, diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Assistência Social no Distrito Federal (Sindsasc). "Mesmo assim, a espera continua longa. Em algumas unidades não tem mais vaga para esse mês, em outras ainda têm algumas poucas", acrescentou.
Faltando menos de uma semana para o 1º turno das eleições, o Brasil de Fato reúne os propostas dos candidatos ao GDF para a área de assistência social.
Os programas de governo consultados são aqueles registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Candidaturas que não estão mais no páreo, como Rafael Parente (PSB) - que desistiu para apoiar Leandro Grass (PV) - e Renan Arruda (PCO), que teve a postulação indeferida pelo Tribunal Superior Eleitoral do DF (TRE-DF), em razão de não estar quite com a Justiça Eleitoral, não foram incluídas nesta seleção.
Coronel Moreno (PTB)
O candidato não tem plano de governo.
Ibaneis Rocha (MDB)
Sob a gestão do atual governador, que tenta a reeleição, o DF viveu a maior crise na área de assistência social de sua história. Em seu plano de governo para um eventual segundo mandato, Ibaneis Rocha lista uma série de objetivos, com foco em grupos específicos, como crianças e adolescentes, mulheres em situação de violência ou pobreza, idosos, pessoas com deficiência, população em situação de rua, entre outros grupos vulneráveis.
Entre as medidas, está a execução do o programa DF Brincar que tem como escopo beneficiar famílias do Programa Criança Feliz por meio de transferência de renda. Também fala em executar o programa Incentiva DF, destinado aos adolescentes com idade entre 15 e 18 anos e que objetiva a promoção da autonomia social.
Outra proposta, não detalhada, é a ampliação do programa Agentes da Cidadania, que concede bolsa social destinada a mulheres em situação de pobreza ou extrema pobreza que participam ativamente do trabalho social com indivíduos e famílias da comunidade local. Outra bolsa prevista seria destinada aos chamados agentes da cidadania ambiental, programa voltado aos catadores de materiais recicláveis, de modo a contribuir para a inclusão no mundo do trabalho na área ambiental.
O atual governador ainda promete um benefício de transferência de renda destinado aos integrantes das famílias beneficiárias do Programa Auxílio Brasil, cuja idade seja superior a 15 anos e que estejam frequentando os cursos de educação para jovens e adultos.
Das propostas mais específicas, o programa de Ibaneis fala na criação Centro Dia da Estrutural, que seria a primeira unidade no Distrito Federal que assistirá aos idosos em situação de vulnerabilidade social na região. Também promete a criação do CREAS Itapoã, assegurando proteção social especial às pessoas e famílias vítimas de violação de direitos, ampliação do número de atendimento de Cadastro Único às famílias de baixa renda, consolidação do Programa Prato Cheio e a ampliação da oferta de Cesta Verde e de Cesta Básica in natura.
O governador ainda promete expandir a rede de Restaurantes Comunitários, com a implementação de café-da-manhã e jantar em todas as unidades. Além disso, fala em fortalecer o programa de transferência de renda (DF Social), aprimorar o controle na concessão de benefícios sociais, "com o devido cruzamento de dados como forma de reduzir fraudes e a utilização indevida do dinheiro público; ampliar a regularização de terrenos públicos para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e entidades religiosas via Moeda Social; melhorias estruturais nas unidades de atendimento ao público; e implementação de estrutura móvel para atendimento e busca ativa das famílias com maior índice de vulnerabilidade social, residentes em área urbana ou rural.
Izalci Lucas (PSDB)
O plano de governo de Izalci Lucas traz a temática do desenvolvimento social como eixo temático, mas não especifica propostas detalhadas para a área. Apenas duas menções mais concretas são anunciadas. Uma é a implementação do que chama de "Gestão Social da Condição de Vida em todas as faixas etárias, como meta de superação do assistencialismo, da exclusão e da pobreza". O programa também promete estruturar o atendimento, ações e programas de prevenção, acolhimento e proteção para vítimas de violência e estabelecer um renda familiar mínima, com garantia de remuneração da dona de casa.
Keka Bagno (PSOL)
O programa da candidata dedica um capítulo inteiro para abordar a questão da pobreza, fome e desigualdades sociais. Primeiro, faz um diagnóstico da atual situação vivida pelo DF, com a piora dos indicadores de insegurança alimentar, desemprego e consequências socioeconômicas da pandemia.
"O aumento desproporcional da fome em nosso território pode ser explicado pelo aumento de trabalhadores desempregados, pelas dificuldades geradas pela Pandemia da Covid-19 - como o distanciamento social ou mesmo a morte e adoecimento de chefes de família -, pela forte inflação com aumento expressivo dos preços dos alimentos, pelo fim de programas sociais e de transferência de renda e pelo insignificante aumento do salário mínimo no último período", diz um trecho do programa.
Para enfrentar esses problemas, a principal proposta da psolista consiste na criação de um programa de renda básica permanente, que assegure uma renda básica mensal de R$ 600 para trabalhadores inscritos no Cadastro Único de Programas Sociais (CadÚnico) do governo federal, cuja renda familiar per capita seja de até meio salário mínimo. A prioridade dessas transferências serão para mulheres, sendo que no caso das mães solo ou de chefe de família responsável por pessoas com deficiência e idosos, esse benefício será de R$ 1.200, podendo ser acumulado com outros benefícios sociais, nacionais ou distritais, recebidos por algum integrante da família.
De acordo com o programa de Keka, a meta é erradicar a fome no Distrito Federal e contribuir para a geração de emprego e renda, de modo a dinamizar a economia local. "Para tanto, à frente do Palácio do Buriti, encaminharemos para a Câmara Legislativa projetos de lei que aumentem o orçamento de políticas sociais e promovam a tributação progressiva sobre multimilionários, a fim de, em quatro anos de gestão, beneficiar e realizar o acompanhamento biopsicossocial de até 206 mil famílias em situação de fome e insegurança alimentar.
Para financiar a renda básica permanente, o programa da candidata pretende implementar uma tributação progressiva sobre imóveis a partir de R$ 5 milhões, para inverter a lógica do pobre pagar proporcionalmente mais impostos do que os milionários. A proposta é dobrar a alíquota de tributos como IPTU, ITCMD e ITBI de imóveis a partir de R$ 5 milhões e triplicar em caso de imóveis a partir de R$ 20 milhões. Além disso, destinaremos parte da arrecadação tributária já existente, que aumenta de 3% a 6% e gera uma receita nova de R$ 3 bilhões ao ano, para o enfrentamento à fome e promoção de proteção social. "Hoje esse recurso tem sido destinado, sucessivamente, às empresas de ônibus e ao IGES-DF, sem que haja melhora nos serviços, transparência e controle social de para onde o recurso público é destinado", ressalta o programa.
Ainda no combate à fome, o programa prevê apoio do GDF para instalação e manutenção de 10 Cozinhas Comunitárias Populares nas cidades mais vulneráveis do DF, ampliação para 16 unidades do Restaurante Comunitário e ampliação do programa de aquisição de alimentos de pequenos agricultores. O plano também tem como meta garantir alimentação escolar 100% Agroecológica em quantidade e qualidade para todas as escolas, além do fortalecimento do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do DF e aplicação e melhorias de estrutura das feiras livres e agroecológicas.
A candidata Keka Bagno também propõe criar uma linha de crédito no BRB para promover empreendimentos solidários de comercialização de alimentos e refeições saudáveis; intensificar campanhas em massa e ações de Educação Alimentar e Nutricional nos equipamentos de políticas públicas do DF; fomentar a agricultura agroecológica urbana; e estender a redução de alíquota de ICMS para mais produtos alimentícios que integram a cesta básica.
Na parte de serviços de assistência social, o plano de governo promete reformar e ampliar as unidades existentes, instituir Casa de Passagem e ampliação de Acolhimentos para pessoas LGBTQIA+, implantação de albergues para famílias, pessoas em situação de pobreza extrema ou que residem em situação de risco que possam levar seus pertences e animais domésticos.
Também há previsão de realização de concurso Público para equipes de abordagem social nos territórios de maior concentração de vulnerabilidade; implementação de mais 2 Centros POP, nas saídas Norte e Sul; implantação e operação de banheiros públicos e disponibilização de água potável para a população em situação de rua.
Outro ponto previsto é a reformulação do serviço de moradia social para população em situação de vulnerabilidade social, contemplando suas reais necessidades, como local para armazenamento de materiais recicláveis, no caso de catadores em situação de rua e atendimento imediato, no caso de vítimas de violência doméstica.
A candidata promete ainda estabelecer atendimento prioritário para povos tradicionais pelos Centros de Referências Especializados em Assistência Social (CREAS); criação de aplicativo para agendamentos do CadÚnico; reestruturação do 156 para agendamentos; campanhas de comunicação de como realizar cadastramento nos serviços de assistência social; e pagamento de hora extra para os especialistas de assistência social com remuneração adequada.
Leandro Grass (PV)
O programa do candidato também propõe criar um renda cidadã mínima, com o objetivo de eliminar a fome e a extrema pobreza no DF, garantindo às famílias que estão nesta situação, em especial as chefiadas por mulheres, o pagamento de valor em dinheiro que permita o atendimento de suas necessidades básicas.
"Paralelamente, serão adotadas outras medidas de proteção social e implantadas políticas públicas que possibilitem trabalho e renda às pessoas em situação de maior vulnerabilidade".
O programa também prevê uma ampliação e reestruturação dos Cras, Creas e Centros Pop nos territórios, "como equipamentos de referência que articulam, integram as ações, acolhem as pessoas que necessitam da Assistência Social, viabilizam sua convivência, promovem autonomia e lhes garantem os mínimos sociais".
Grass também promete "zerar a fila de atendimento nos Cras", reduzindo a demanda reprimida por meio do recadastramento no Cadastro Único para programas e benefícios. O acesso a alimentos in natura e a alimentação saudável também deverá se estimulado, com concessão de cesta de alimentos adquiridos em programas de aquisição da agricultura familiar e acesso a refeições disponibilizadas em equipamentos como restaurantes comunitários e cozinhas comunitárias, "que devem cobrir todas as regiões". O candidato também se compromete a contratar novos servidores para enfrentar o déficit de profissionais da assistência social em relação à demanda.
Leila do Vôlei (PDT)
O programa de Leila também faz um balanço das atuais políticas de assistência social do DF, na primeira parte do plano de governo, destinada ao diagnóstico dos problemas encontrados. Na segunda parte, já com propostas estruturadas por setor, a parte de desenvolvimento social aponta uma série de de metas e iniciativas.
Uma delas é a instituição de um único cartão, que se chamará DF Inclusivo, que reunirá todos os benefícios sociais existentes, de acordo com o tamanho e renda da famílias. Também propõe a construção do Marco Legal da Assistência Social do DF, com integração dos programas e maior eficiência na alocação dos recursos.
O plano de governo também propõe remodelar o sistema de assistência social, incluindo, por exemplo, a atualização dos cadastros, implantação de pelo menos um Cras em cada região administrativa, que será revitalizado como um ponto de referência para todas as políticas de assistência, como se fosse um "Na Hora Social". Também propõe a criação do Cras Rural.
Para a população em situação de rua, a candidata promete aumentar as vagas em albergues, priorizar inclusão em programas de moradia social, criação de um Centro Pop itinerante, com espaço para emissão de documentos, banho, corte de cabelo, barba e outros serviços de higiene pessoal, como distribuição de absorvente, além de atendimento médico e psiquiátrico.
Na parte de enfrentamento da insegurança alimentar, o programa também fala em ampliar o número de restaurantes comunitários, criação de um restaurante comunitário itinerante para distribuição de marmitas em locais com maior adensamento de população vulnerável, gratuidade de alimentação para crianças até 6 anos de idade, apoio, capacitação e incentivo para hortas comunitárias, reforço na merenda escolar, com inclusão de um lanche que as crianças possam levar pra casa para complementar a alimentação. O plano ainda prevê distribuição gratuita de alimentos in natura para famílias vulneráveis.
O programa de Leila do Vôlei também propõe o estabelecimento de casas abrigo para mulheres em todas as regiões do DF, em rede com a Casa da Mulher Brasileira. Também prevê um nova Delegacia Especial de Atendimento à Mulher na região Norte da capital, focalização de linhas de crédito especiais com recorte de gênero e raça, criação de um escola de negócios socialmente sustentáveis para treinar e capacitar as mulheres.
Outro projeto enunciado é o de Terapia Social, com oferta de acompanhamento psicológico para prevenir e tratar depressão pós-parto e outros problemas psicológicos, campanhas de conscientização sobre violência doméstica e outros abusos.
O programa da candidata do PDT ainda aborda medidas para capacitar e oferecer crédito a empreendedores negros, criação do projeto DF Sem Racismo, com campanhas institucionais de combate a preconceito, programas de concessão de bolsas de iniciação científica para jovens estudantes negros. Medida similares também estão previstos para população LGBTQIA+ e pessoas com deficiência.
Lucas Salles (DC)
O programa do candidato do partido Democracia Cristã tem como um dos eixos a garantia de segurança alimentar e nutricional e redução do número de pessoas em situação de rua no DF, sem explicar como fazer. Na parte de desenvolvimento social e humano, o programa faz um diagnóstico da situação de desigualdade de renda, especialmente e relação aos moradores do Entorno do DF. Cita ainda que o serviço mais demandados atualmente é a inscrição ou atualização do CadÚnico, que é a porta de entrada para o recebimento de benefícios sociais, como Auxílio Brasil, cartão Prato Cheio e outros, mas que o sistema está despreparado, com número insuficiente de servidores e estrutura física inadequada.
Paulo Octávio (PSD)
Bastante sucinto, o programa de Paulo Octávio, um dos candidatos mais ricos do país, agrega assistência social e saúde em um único capítulo de duas páginas. Sobre assistência, há apenas um menção genérica ao compromisso de reorganizar os programas sociais e atendimentos nos Cras.
Robson (PSTU)
O candidato Robson apresenta um balanço bastante crítico da situação social, econômica e política do DF, com críticas ao atual governo, mas também a todos os outros candidatos. Na parte de assistência social, menciona que a fila de espera para recebimento de algum benefício é de 200 mil pessoas, o que corresponde a quase 7% da população do DF, que possui cerca de 3 milhões de habitantes.
De forma específica, propõe a criação de uma bolsa assistencial para mulheres vítimas de violência doméstica, no valor de um salário
mínimo, e bolsa assistencial para população LGBTIQIA+ vítimas de violência e garantia de atendimento especial para concessão de benefícios como o auxílio aluguel.
Téo Cruz (PCB)
O candidato Téo Cruz aborda de maneira mais genéricas as questões de assistência social em seu plano de governo, em que promete, por exemplo, criar conselhos populares para a gestão pública administrativa de todas as cidades do Distrito Federal. Propõe também a "erradicação da fome, do desemprego, através de políticas públicas de geração de empregos em atividades voltadas ao atendimento das necessidades sociais, por meio das instituições e políticas públicas.
Outra proposta é a criação de redes de restaurantes, lavanderias e creches públicas que atendam toda a população do DF e entorno; demarcação de terras indígenas e quilombolas no DF com infraestrutura e autonomia garantidas às populações. Por fim, menciona a "valorização, atenção e criação de oportunidades aos idosos, à juventude, às mulheres e às pessoas portadoras de necessidades especiais, além da garantia para a "diversidade dos direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores com políticas de combate ao racismo, ao machismo, à LGBTfobia e ao capacitismo".
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Edição: Flávia Quirino