Em entrevista concedida a um podcast, veiculada nesta sexta-feira (14), o presidente Jair Bolsonaro (PL) relatou que, durante um passeio de moto, numa comunidade periférica do Distrito Federal, encontrou meninas venezuelanas, com idade entre 14 e 15 anos, que segundo ele, estariam se arrumando num sábado para "ganhar a vida".
O fato teria ocorrido em São Sebastião, região administrativa da capital federal. Ele não informou quando o episódio ocorreu, apenas disse que foi durante um passeio de moto, que ele costuma fazer com frequência em Brasília. O caso, segundo o próprio presidente, já teria sido relatado durante uma de suas lives semanais.
"Eu estava em Brasília, na comunidade São Sebastião, se não me engano, passeando de moto [...]. Parei a moto numa esquina, tirei o capacete, e olhei umas menininhas, umas três ou quatro, de 14 e 15 anos, bonitas e arrumadinhas, num sábado, numa comunidade, e vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei, perguntei se podia entrar na casa, entrei. Tinha umas 15 a 20 meninas, sábado de manhã, se arrumando. Todas venezuelanas. E eu pergunto: meninas bonitinhas, 14 ou 15 anos, se arrumando no sábado pra quê? Ganhar a vida", disse o presidente.
A fala ocorreu a partir do minuto 29 da transmissão. Embora não especifique o ano, o presidente dá a entender que o caso ocorreu durante o seu mandato. O trecho desta fala rapidamente se espalhou pela internet neste sábado (15), e já está entre os assuntos mais comentados do Twitter, com a hashtag #BolsonaroPedófilo.
Para a conselheira tutelar, assistente social e mestre em Políticas Públicas, Keka Bagno, o comentário de Bolsonaro no podcast contém grave apologia à violência sexual, à pedofilia, ao sexismo e à xenofobia.
"As afirmações de Bolsonaro de que 'pintou um clima' com adolescentes, é barbárie. Colocar que o fato das adolescentes estarem se arrumando é por estarem em situação do que ele chama de prostituição e na verdade é exploração sexual, recai em xenofobia e sexismo", destacou.
Segundo ela, após Damares mentir e fazer apologia às violências sexuais contra crianças e adolescentes, Bolsonaro faz o mesmo e ainda pior: assedia sexualmente. "É fundamental que seja denunciado no Conselho Tutelar, Vara da Infância e Juventude e no Ministério Público Federal".
O Brasil de Fato entrou em contato com a assessoria do Presidente para saber se ele formalizou algum tipo de denúncia às autoridades competentes sobre essa suposta exploração sexual de adolescentes venezuelanas e também questionou sobre o que ele quis dizer quando afirmou que "pintou um clima" com as meninas descritas por ele na entrevista.
A reportagem também tenta contato com o Conselho Tutelar de São Sebastião para saber se há conhecimento sobre exploração sexual de adolescentes venezuelanas na região administrativa.
Venezuelanos em São Sebastião
A Cáritas Arquidiocesana de Brasília, que é responsável pelo projeto Pana no Distrito Federal, informou que existe uma média de 2 mil pessoas venezuelanas em São Sebastião, entre jovens, adultos e idosos e que desconhecem casos de exploração sexual de crianças e adolescentes.
Especialistas
Para Andreia Crispim, psicóloga, especialista em Políticas Públicas, Infância, Juventude e Diversidade pela Universidade de Brasília (UnB), Bolsonaro fere a Constituição especialmente em seu Artigo 227. "Se equivocou criminalmente ao categorizar como prostitutas adolescentes em contexto de exploração sexual, já reconhecido pela Organização Internacional do Trabalho, como uma das piores formas de trabalho infantil. Isso evidencia um duplo flagrante, o presidente faltou com o cumprimento do seu dever, como homem, membro da sociedade e Presidente do país e ainda total desconhecimento e descomprometimento com a legislação internacional e nacional de proteção de crianças e adolescentes".
O professor e criminalista Luiz Carlos da Rocha, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) aponta que no vídeo Bolsonaro confessa ter se envolvido em uma situação muito suspeita que insinua gravemente a exploração sexual de crianças, meninas venezuelanas. "Se foi isso, como ele diz que parecia ser, pode ser enquadrado em algum tipo penal contra a liberdade sexual, se teve algum tipo de relação com as crianças, ou de prevaricação por não ter tomado providências".
O que pode acontecer?
De acordo com a Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares do DF, existem dois caminhos para a responsabilização do presidente, após essa entrevista. O primeiro é uma investigação por crime comum, caso o Ministério Público Federal ofereça denúncia e um crime de responsabilidade administrativa, por ser o principal autoridade do Poder Executivo do país e ter o dever de denunciar e agir contra crimes desse cunho. Outra possibilidade é via Justiça Eleitoral por noticiamento de fato inverídico, caso esses crimes sejam reconhecidos como inverídicos, o que acarretaria na inelegibilidade do presidente.
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Edição: Flávia Quirino