De acordo com o estudo “Juventude: perfil sociodemográfico, educação, mercado de trabalho e jovens nem-nem”, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF), em 2021, 20,8% dos jovens no Distrito Federal, com idade entre 15 e 29 anos, não trabalhavam e nem estudavam.
Este percentual, segundo o estudo, corresponde a cerca de 150 mil pessoas, considerando que, em 2021, residiam no DF 725.916 jovens, representando 24,1% da população brasiliense.
Os dados da pesquisa foram apresentados na primeira semana de novembro e um dos focos da análise é o recorte social dos chamados “jovens nem-nem”, considerados aqueles que estão fora do mercado de trabalho e que não estudam em instituições formais de ensino.
A transição para o mercado de trabalho é um desafio para uma grande parcela de jovens por ser um processo não imediato, não linear, e marcado por dificuldades e que perpassa importantes questões de gênero e de raça, como aponta o estudo.
Ao analisar o perfil sociodemográfico desses jovens, percebeu-se que certas diferenças eram relevantes: o fato de ser negro, assim como ser mulher – especialmente com filhos –, aumentou expressivamente a chance de um jovem ser um nem-nem.
Na visão da coordenadora do programa Jovem de Expressão, Rayane Soares, essa marcante diferença na condição de nem-nem, no que se refere a proporção de pessoas negras jovens, perpassa pelo fato desses indivíduos não usufruírem de seus direitos.
“A juventude negra sofre com a questão dos impactos do racismo estrutural. Vemos aqui no DF, a capital do Brasil, que a juventude (negra) ainda está na margem da sociedade, em um espaço de vulnerabilidade. E fico pensando na questão dessa pesquisa, a forma como apresenta parece que coloca responsabilidade no jovem por estar nessa situação. Então, observando os dados, acho que seria importante levantar a questão: Como são oferecidas essas vagas no mercado? Como a universidade acolhe esses jovens? Como é o acesso à educação? Porque, se esses jovens não trabalham nem estudam, de alguma forma os direitos deles estão sendo negados. É um sinal que não estão tendo acesso a políticas públicas”, avalia Rayane.
A renda também mostrou ser um fator que influencia essa defasagem na formação escolar básica e na qualificação para o emprego: 30,9% dos jovens nas classes D e E do DF não trabalhavam e nem estudavam em 2021. Esse percentual reduz à medida que se observa as classes mais altas, como a classe A, na qual apenas 9% dos jovens eram considerados nem-nem.
Para a coordenadora do Levante Popular da Juventude no DF, Jennifer Marques, esses dados representam a falta da capacidade do governo do Distrito Federal em tornar possível que essa juventude acesse uma boa educação e tenha qualidade de vida.
“Os jovens periféricos enfrentam mais dificuldades e jornadas mais longas que os jovens que vivem em áreas mais privilegiadas. Enquanto uma parcela da juventude não estuda porque não tem oportunidades e não trabalha por este mesmo motivo, ou exerce trabalhos domésticos sem nenhuma remuneração, ou estuda sozinho, sem auxílio pra tentar entrar na universidade, outra parcela da juventude estuda nas melhores escolas e não precisa nem lavar um banheiro. Essa desigualdade continua a crescer porque o governo do Distrito Federal não torna possível que essa realidade se transforme e nem viabiliza projetos que tentem fazer com que esses jovens estudem ou trabalhem”, constata Jennifer.
Ausência de políticas públicas
A mestre em sociologia pela Universidade de Brasília Laura Valle Gontijo, que integra o grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho (GEPT/UnB), reforça a ausência do governo do DF em amparar esses jovens por meio de políticas públicas específicas, o que amplia as desigualdades já grandes vistas entre as regiões administrativas.
“Há uma situação de vulnerabilidade maior para populações residentes em regiões mais pobres, onde as oportunidades de emprego locais se concentram no setor de serviços pouco complexos e no comércio, em que vínculos empregatícios têm menor estabilidade trabalhista".
Para a socióloga essa constatação aponta que existe no DF uma vulnerabilidade estrutural para essas populações. "As políticas públicas voltadas a reverter essa realidade no Brasil e no Distrito Federal têm sido insuficientes frente à magnitude do problema. Há uma ausência de políticas públicas voltadas especificamente aos jovens. Também se faz necessário o estabelecimento de iniciativas voltadas para a capacitação e a inserção no mercado de trabalho de um grupo de trabalhadores que se viu excluído da economia, fazendo o DF se inserir em um quadro de desigualdades extremas e persistentes”, evidencia.
Laura Gontijo também afirma que os dados da pesquisa revelam uma situação crítica sobre a condição de trabalho e estudo dos jovens que residem no Distrito Federal.
“É um potencial de oportunidades e talentos que deixa de ser aproveitado na atualidade e que muito provavelmente encontrará dificuldades ainda maiores de inserção produtiva e de vida plena no futuro face às mudanças tecnológicas que impactam as cadeias globais de produção e a economia digital. Se esses jovens em situação de vulnerabilidade social não estão nem trabalhando nem estudando, a perspectiva de futuro melhor se esvai na desesperança e desalento. Situação que tenderá a se perdurar reproduzindo o ciclo da pobreza e da falta de oportunidades para parcela considerável de nossa população que enfrentam barreiras para a inserção no mercado de trabalho”, aponta Laura.
A conclusão do estudo traz um apontamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de que a escolarização, a qualificação e o crescimento econômico são condições necessárias, mas não suficientes, para garantir uma inserção adequada do jovem no mercado de trabalho. Como apontado pelas especialistas, precisam ser combinadas com políticas públicas de redução da desigualdade, ações de oferta e demanda no mercado de trabalho e com outras medidas de promoção de trabalho de qualidade.
Perfil Sociodemográfico
O estudo apontou ainda que 17,3% da juventude do DF se concentra nas classes D e E e que apenas 5,2% dos jovens se concentram na classe A, com renda familiar mensal superior a R$ 24 mil reais. Outra constatação do estudo é de que a juventude negra no Distrito Federal é 59,6% superior à proporção da população negra como um todo no território (57,3%). Ainda nesta pesquisa, foi apontado que 5,9% dos jovens do DF se identificam como sendo LGBTQIA+.
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Edição: Flávia Quirino