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Violência

Artigo | “Soluções” autoritárias não oferecem segurança às escolas

"As medidas indispensáveis para prevenir atos terroristas passam pela resposta firme aos discursos fascistas"

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
"Debater a raiz do aumento desses casos nos últimos tempos é a única forma de prevenção eficaz." - Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O caso do ataque na escola Thomazia Montoro, na capital paulista, que levou à morte a professora Elizabete Tenreiro, 71 anos, trouxe à luz diversos problemas a serem enfrentados para o combate à violência nas escolas.

O crime - cujas imagens de uma criança de treze anos, com uma faca nas mãos, provocando tanta desgraça antes de ser barrada, causaram perplexidade - faz com que a questão da segurança seja a primeira a chamar a atenção. Afinal, toda a comunidade escolar se sente vulnerável diante de ameaças desse tipo. Mas há questões mais profundas que, se não enfrentadas agora, levarão ao aumento dessa violência, sem que os mecanismos de segurança surtam efeito.

Debater a raiz do aumento desses casos nos últimos tempos é a única forma de prevenção eficaz.

É importante entender os casos recorrentes nos Estados Unidos, onde escolas e comunidade, mesmo preparadas para a defesa, não conseguem evitar tragédias como a do último dia 27 de março, em que um jovem de 28 anos atacou a tiros uma escola em Nashville e matou três crianças de nove anos e três funcionários adultos. O ataque foi o 131º caso do tipo nos Estados Unidos desde o início deste ano, segundo a Gun Violence Archive, uma organização sem fins lucrativos que monitora dados de violência armada.

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No Brasil, ao mesmo tempo em que falamos sobre as urgentes melhorias na estrutura das escolas públicas, é preciso pensar sobre os discursos de ódio, fomentados pela extrema direita, que levam a muitos dos atentados. Temos uma parte da juventude fortemente influenciada pelos ideais dos supremacistas brancos dos Estados Unidos e as células neonazistas no Brasil cresceram 300% desde 2019.

No entanto, é preciso atentar que esses discursos de ódio estão presentes no cotidiano escolar, de fora para dentro, trazidos pelos alunos sob influência de suas famílias e círculos sociais, e, também, de dentro para fora, disseminados em discursos de parte dos educadores que entendem a escola como espaço de controle social e repressão às camadas populares.

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O professor e dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE), Daniel Cara, apontou, em seu twiter, que “a sociedade brasileira lida com o problema de forma superficial e efêmera", e que as “comunidades escolares permanecem desamparadas”. Ele foi o organizador do relatório “Ultraconservadorismo e Extremismo de Direita entre Adolescentes e Jovens no Brasil”, lançado em dezembro de 2022 e encaminhado ao grupo de transição da área de educação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

De acordo com matéria publicada no site da CNTE, o documento associa o crescimento de atos de violência à escalada do ultraconservadorismo e do extremismo de direita no país e à falta de controle e criminalização desses discursos e práticas. Segundo o levantamento, ao longo dos anos 2000, ocorreram 16 ataques em escolas brasileiras, que mataram 35 pessoas e deixaram 72 feridas.

A pesquisadora Letícia Oliveira, editora do site El Coyote, que monitora grupos de extrema direita no Brasil há 11 anos, também colaboradora do relatório, explica que comunidades específicas nas redes sociais cultuam quem comete atentados nas escolas e consideram ações violentas como os massacres de Suzano, em São Paulo, e Realengo, no Rio de Janeiro, marcos desse movimento.

O caso da escola da zona oeste de São Paulo está diretamente ligado aos ataques anteriores, ocorridos em Suzano (SP) e em Aracruz (RS), pois o assassino de Bete usava, em sua conta no twitter, o mesmo sobrenome que um dos assassinos de Suzano e ostentava em suas vestes uma balaclava de caveira, símbolo de supremacistas brancos norte-americanos, utilizada também pelos assassinos de Suzano e Aracruz.

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Misoginia, machismo, racismo, LGBTfobia, supremacismo racial e culto à violência são elementos alimentados pelo bolsonarismo nos últimos anos e é urgente que esses temas sejam enfrentados com a devida clareza e consequência, sob pena de permitirmos que os responsáveis pela violência fascista sejam os propositores das “soluções”.

O fascismo é a face mais perversa do capitalismo, não o seu oposto. A opressão de uma classe sobre a outra é a essência desse sistema cuja única liberdade possível é a da manutenção dos lucros das grandes corporações.

Se hoje nos assustamos com ataques de jovens dominados pelo ódio, precisamos nos lembrar que vivemos por 21 anos sob governos que matavam e torturavam mães, na frente de seus filhos crianças, nos porões da Ditadura Militar da qual Bolsonaro é cria e seus admiradores fãs. Por sua vez, esses violentos homens armados da ditadura são herdeiros dos senhores escravocratas que matavam e torturavam aqueles que produziam suas riquezas.

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A cooptação dos jovens pelo neonazismo e a assimilação da ideologia da extrema direita por parte da sociedade nada mais é do que a moderna arma dos poderosos contra o povo.

No momento da exposição dos ataques, os que defendem os programas de militarização de escolas, a política de armamento indiscriminado e apoiam governos que promovem o fim das políticas de saúde mental, são os primeiros a mostrarem indignação e a usarem os casos de violência como pretexto para sustentar seu apoio aos ideais fascistas de aumento da repressão contra o povo.

Por outro lado, os que entendem a escola pública como espaço para a coletividade educar o indivíduo para uma sociedade justa e democrática sabem que as medidas indispensáveis para prevenir atos terroristas passam pela resposta firme aos discursos fascistas.

Se os trabalhadores reproduzem a ideologia da classe economicamente dominante, a luta contra a opressão passa pela conscientização classista. No caso da violência nas escolas públicas, é preciso escapar das armadilhas dos defensores de mais repressão violenta contra o povo e pensar em soluções emergenciais e a longo prazo.

Oliveira alerta que, para se identificar possíveis agressores é fundamental o monitoramento das ações e a atenção em sinais de preconceitos. Para a pesquisadora, “uma das formas de prevenção é entender como funcionam os meandros desses jovens que cultuam assassinos em massa nas escolas e dar ferramentas que possibilitem a comunidade escolar perceber se os alunos e alunas estão sendo cooptados pela extrema direita ou estão frequentando algum tipo de comunidade. Muitas delas abertas e acessíveis a todos. Misoginia e racismo são sinais mais característicos de alguém com potencial para ataques”, recomenda.

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Tais ferramentas envolvem melhoria nas condições de trabalho de professores e funcionários de escola e valorização dos servidores públicos como agentes de promoção de bem-estar social. Fundamental lembrar que, no último governo, os servidores públicos foram elencados como estorvo para o Estado e inimigos da população. Em nome de um projeto privatista de Educação Domiciliar, professores foram tachados como doutrinadores perigosos. O antigo ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, disse que era preciso jogar uma granada no bolso dos servidores, para explodir com sua reforma administrativa.

Além da valorização dos profissionais, questões básicas como atendimento psicológico à professores e alunos; serviços de saúde e assistência social nas escolas; treinamentos e formações para identificação de distúrbios socioemocionais; infraestrutura que facilite a prevenção de ataques; um programa de mediação que permita a solução de conflitos no ambiente escolar, são fundamentais para se começar a pensar em um ambiente seguro.

Como em tudo o que se refere à problemas sociais, a solução não depende de medidas rápidas e superficiais.

As supostas soluções autoritárias não trarão segurança às escolas porque partem dos princípios violentos de controle social. Precisamos aperfeiçoar a participação popular nas escolas, criar gestão democrática, que garanta o envolvimento da comunidade com o cuidado e com as possibilidades de melhorias nas relações pessoais no cotidiano escolar.

*Maria Dolores Zundt é professora da Educação Básica rede estadual do estado de São Paulo. Militante da LPS – Luta Pelo Socialismo.

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.

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Edição: Flávia Quirino