Em 22 de julho, a humanidade encarou mais um novo desafio urgente: restam menos de 6 anos para evitar as catástrofes climáticas, pois a temperatura média do planeta está prestes a aumentar 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, um limiar crítico estabelecido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
Nossa situação é ainda mais preocupante, pois a tragédia ambiental pode se desenrolar em um prazo ainda mais curto, devido ao aumento contínuo das emissões de gases do efeito estufa, contrariando os acordos climáticos firmados por muitos países.
Como um alerta sobre essa questão, foi criado em setembro de 2020 o "Climate Clock", ou Relógio Climático, que exibe o tempo restante até que ocorra o aumento de 1,5°C na temperatura global. O movimento também divulga as ações benéficas que "seguram o fim do mundo", destacando a quantidade de territórios atualmente protegidos por povos indígenas, abrangendo 43 milhões de km², reconhecidos por seu papel histórico na resistência e na proteção ambiental.
Mas por que um aumento médio de 1,5°C é tão alarmante?
Pode parecer pouco, uma mudança de temperatura que invariavelmente experimentamos no cotidiano. Porém, o planeta é um organismo vivo, tal como o corpo humano, em que 1,5°C caracteriza-se como febre alta e, quando mantida continuamente, leva à morte, do mesmo modo que qualquer variação de temperatura irreversível na Terra causa problemas.
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Assim, caso a temperatura média global aumente o esperado, ou até mais do que isso, tempestades de areia, ondas de calor, enchentes, aumento do nível do mar e extinção de diversas espécies da fauna e da flora serão algumas das catástrofes que teremos de lidar. Vale salientar que, por mais que elas ocorram, como as enchentes anualmente experimentadas no Sudeste, o cenário é de aumento e de agravamentos alarmantes.
Historicamente, o Sul Global, onde o Brasil está situado, tem sido a região mais pobre e periférica do planeta e enfrentou inúmeras adversidades decorrentes da exploração. Ela manifestou-se através de atividades como mineração e o cultivo extensivo de culturas como o açúcar e outros produtos, bem como por meio da prática cruel da escravidão e do genocídio dos povos nativos. O colonialismo, nesse contexto, emergiu como uma das formas mais opressivas generalizadas em um mundo cada vez mais globalizado.
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Entretanto, foi com o avanço do desenvolvimento industrial pautado em um sistema econômico exploratório e expansionista que a opressão sobre não apenas a sociedade do Sul Global, mas tudo, desde suas terras ao seu modo de organização social, tomou a forma que conhecemos hoje. Assim, não é devanear ao relacionar esse momento histórico às crises que enfrentamos atualmente.
É evidente que a atual catástrofe não afeta todos os lugares da mesma forma e intensidade. Essa disparidade é alimentada pelo sistema imperialista, que nos segmenta em zonas com graus distintos de importância. Esse mesmo sistema faz com que alguns países mais influentes sejam responsáveis por níveis mais elevados de gases do efeito estufa na atmosfera, devido à sua economia construída sobre um sistema industrial essencialmente insustentável a longo prazo.
Quando não são eles próprios os maiores responsáveis, são suas empresas, que em geral operam em solos sulistas devido às isenções fiscais, menor carga e impostos ou leis mais frágeis. Em contrapartida, enchentes e secas prolongadas, por exemplo, recentemente mais presentes no Norte Global, são há décadas sentidas por nós, sem que nossos apelos ou nossas indignações sejam ouvidos.
Assim, negar que a crise climática é baseada em explorações de classe, de cor, de gênero e de etnia é quase tão grave quanto negar a própria existência dela.
Nesse contexto, é inegável que as ações predatórias da agroindústria brasileira contribuem não só para esse imperialismo, mas para a emergência climática imediata. E aqui não refiro-me a pequenos agricultores ou a agricultura familiar, mas a grandes latifundiários que cobrem o Brasil com monoculturas de soja e de milho que serão exportados.
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E a custo de quê? Tendo faturado 387,2 bilhões de reais em venda externa em 2019, o setor foi taxado em apenas 16,3 mil reais em impostos de exportação, vendendo a oportunidade de um presente e de um futuro.
O Estado brasileiro tem sido conivente com a crise climática ao isentar aqueles que, nacionalmente, mais destroem nossas florestas, com desmatamentos recordes e liberação de toneladas de metano (gás estufa mais potente) na atmosfera, sem qualquer tipo de benefício em troca para o país.
Exigimos não só que essas isenções fiscais acabem, mas que sejam super taxadas, em uma implementação concreta de soluções sistêmicas para a crise climática.
Caso esse aumento de 1,5°C ocorra em 2029, estaremos violando não apenas o Tratado de Paris, que previu essa ampliação para o final do século, como também outros acordos menores, mas ainda assim importantes, de enfrentamento ao aquecimento global. Nossos governos e as corporações terão falhado não apenas com o planeta, mas também conosco enquanto humanidade. A Terra continuará aqui, algumas espécies sobreviverão com as adversidades climáticas, mas a espécie humana provavelmente não contará com isso.
Dessa maneira, percebe-se que ações eficazes e firmes quanto à crise climática nunca foram tão urgentes. As medidas até então tomadas pelo Poder Público têm se mostrado insuficientes, com isenções fiscais e anistia para aqueles que destroem nossas florestas e nossos ares. Cansamos de promessas utópicas vazias, cansamos de observar acordos globais assinados sem o comprometimento das partes para respeitá-los.
Nós, como organização socioambiental e nossos ativistas climáticos, continuaremos incansavelmente pressionando as autoridades por uma abordagem séria em relação às causas e às consequências do aquecimento climático acelerado que já estamos testemunhando.
Precisamos de planos concretos e corajosos para enfrentar a crise climática, além do comprometimento e apoio da sociedade civil.
O momento de agir é agora, não podemos mais adiar ações que nossos governos deveriam ter tomado há muito tempo, mesmo quando solicitadas por ativistas e cientistas comprometidos.
*Yadriel Rosado é membro do coletivo Jovens pelo Clima Brasília
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
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Edição: Flávia Quirino