Seguiremos, como tantas seguiram, construindo uma sociedade onde possamos viver e amar sem medo.
Dia 29 de agosto é a data que marca o “Dia Nacional da Visibilidade Lésbica”, embora todos os dias tenhamos motivos para celebrar e lutar por nossas existências.
Ouvimos falar sobre o dia da visibilidade lésbica, sobre o dia do orgulho lésbico, e, por vezes, nos confundimos se as duas coisas são uma só. Mas não!
No mês de agosto, as mulheres lésbicas demarcam suas resistências e levantam a bandeira do combate à lesbofobia e do preconceito em dois dias: 19 e 29 de agosto. Mas você sabe como foram escolhidas essas datas?
Então, há quem diga que o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica é comemorado em 19 de agosto e não no dia 29. No entanto, estamos falando de duas datas de grande importância para as mulheres (e pessoas) lésbicas: 19 de agosto, quando comemoramos o Dia Nacional do Orgulho Lésbico, e o dia 29 de agosto, que marca o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Vamos contar um pouco mais sobre cada um desses dias.
Ferro’s Bar
O Ferro’s Bar, antigo bar do centro de São Paulo, foi o cenário de um levante protagonizado por mulheres lésbicas na década de 80. Algumas décadas antes, o bar se tornara um reduto de militantes comunistas. No entanto, com o golpe militar, o espaço se tornou um ponto de encontro, não só para militantes de esquerda no país, mas também um refúgio para a comunidade LGBT.
Com a fim da ditadura, no início dos anos 1980, surge o Grupo Ação Lésbica-Feminista, pioneiro na organização política homossexual no Brasil. Para divulgar suas ideias, as lésbicas do grupo criaram o folheto Chana com Chana para vender no Ferro’s. Mas contrariando todo o histórico do bar, enquanto um lugar de segurança para a população LGBT, o dono do bar simplesmente proibiu a venda do panfleto!
Com a proibição, as lésbicas se organizaram e fizeram um levante na frente do Ferro’s Bar no dia 19 de agosto de 1983, tendo apoio dos movimentos feministas e de personalidades da época, em resistência às violentas expulsões promovidas pelo dono do bar. O episódio não só influenciou outros grupos LGBTQIA+, mas garantiu a venda do Chana com Chana no Ferro’s Bar.
Esse levante foi considerado como a primeira manifestação lésbica brasileira, se tornando um marco histórico na história LGBT brasileira. No meio de toda essa movimentação, havia uma lésbica, agitadora do levante no bar, chamada Rosely Roth. Em 2003, décadas após o ato de resistência das mulheres lésbicas, Rosely Roth suicidou-se, e o dia 19 de agosto passou a ser marcado como o Dia Nacional do Orgulho Lésbico.
29 de agosto e o Seminário Nacional de Lésbicas
Neusa das Dores e Elizabeth Calvet. Duas lésbicas negras que tem tudo a ver com o dia 29 de agosto.
O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica foi instituído no Seminário Nacional de Lésbicas (Senale), em 29 de agosto de 1996, na cidade do Rio de Janeiro. O Seminário foi organizado por Neusa das Dores e Elizabeth Calvet com o intuito de debater temas relacionados à sexualidade, à prevenção de infecções sexualmente transmissíveis, ao trabalho e à cidadania.
Para além de debater sobre essas temáticas, o dia 29 de agosto tornou-se um marco para a visibilidade lésbica e a discussão de políticas públicas de combate à lesbofobia.
Neusa das Dores e Elizabeth Calvet, mulheres negras e lésbicas que deixaram um legado para nossa geração e para as que virão. Elizabeth faleceu sem sabermos a causa de seu falecimento. E Neusa, segue construindo e lutando pelos direitos das pessoas lésbicas.
Essas e tantas outras mulheres (e pessoas) nos inspiram e nos reafirmam que nossos passos vieram de muito longe. E nossa tarefa, é seguir construindo uma sociedade capaz de nos reconhecer enquanto parte fundamental dela.
“Um dia sem lésbica é um dia sem a luz do sol”
“Eu sou quem sou, fazendo o que vim fazer, agindo sobre vocês como uma droga ou um cinzel para que se lembrem do que há de mim em vocês, enquanto descubro vocês em mim.” (Audre Lorde)
Há 27 anos, a data marca a busca pelos direitos das lésbicas e das sapatonas ao resgatar os apagamentos e silenciamentos dos corpos que são historicamente violentados.
Neste texto, não comportaria nem todos os questionamentos e muito menos nossas angústias, nem a história por menores e nem todos os nomes daquelas que lutaram e lutam pela nossa existência. Mas uma coisa é certa: as palavras aqui tecidas buscam resgatar a memória de todas aquelas pessoas que um dia ousaram lutar pela nossa existência.
Para que a luz do sol não pare de brilhar, seguiremos lutando e cobrando políticas públicas ao Estado para que tenhamos vida digna.
Seguiremos sonhando em construir as nossas famílias, inspiradas nas duplas maternidades (e nas maternidades lésbicas solos também).
Seguiremos ansiando por mais lésbicas e sapatonas em espaços de poder, nos esportes, na saúde, e em todos os espaços. Seguiremos, como tantas seguiram, construindo uma sociedade onde possamos viver e amar sem medo.
O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica é um dia de luta, mas também um dia para celebrar e viver nossos afetos, amores e sonhos.
Um dia para sermos quem quisermos, estarmos onde quisermos e nos relacionarmos com quisermos, livres do patriarcado, do machismo, da misoginia, da lesbofobia que atinge nossos corpos não apenas no dia 29 de agosto, mas todos os dias.
Por um Brasil onde o sol não deixe de brilhar, onde as lésbicas não deixem de existir!
*Ângela Amaral, mulher negra lésbica, militante do Levante Popular da Juventude e do Movimento Brasil Popular.
**Thamynny Santos, mulher negra bissexual, professora e militante do Levante Popular da Juventude e do Movimento Brasil Popular.
***Este é um artigo de opinião. A visão das autoras não necessariamente expressam a linha editorial do jornal Brasil de Fato DF.
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Edição: Flávia Quirino