Em meio às discussões que surgem sobre as concessões da Rodoviária do Plano Piloto, da Galeria dos Estados e dos bolsões de estacionamento do CONIC e Conjunto Nacional, vale a pena trazer à tona a visão do urbanista Lúcio Costa e as reflexões sobre o Direito à Cidade.
O debate sobre a função da cidade e a relação entre espaço público e privado é vital para o futuro de Brasília e para a qualidade de vida de seus cidadãos.
Lúcio Costa, urbanista responsável pelo traçado da cidade em forma de avião, tinha uma concepção de cidade que transcendia meros arranjos de edificações e vias. Seu plano visava criar espaços de convivência, troca e integração. Em sua visão, a cidade deveria ser mais do que um amontoado de construções: ela deveria ser um espaço de vivência e pertencimento.
O conceito de "Direito à Cidade", cunhado por Henri Lefebvre, reflete sobre o acesso dos cidadãos ao espaço urbano e a todas as possibilidades que ele oferece. É uma defesa do espaço público como lugar de expressão, cultura, convivência e, acima de tudo, democracia.
A concessão destes espaços, sobretudo para a iniciativa privada, pode representar uma perda significativa no acesso democrático e na utilização plena da cidade. O risco é que a lógica do lucro suplante a função social, cultural e de convivência que tais espaços representam.
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A Galeria dos Estados, por exemplo, já é palco de diversas manifestações culturais, artísticas e sociais. Transformá-lo, através de uma lógica estritamente comercial, pode apagar essa história e silenciar vozes que encontram ali seu lugar de expressão. Da mesma forma, a Rodoviária, um patrimônio histórico, corre o risco de perder sua identidade e função social.
É claro que a manutenção e revitalização destes espaços são necessárias. No entanto, é crucial que tais intervenções sejam pensadas de forma participativa, com envolvimento da sociedade civil, artistas, comerciantes e todos aqueles que fazem da cidade o que ela é.
Outros modelos, que não sejam os privados, devem ser considerados. Modelos de governança colaborativos e participativos, precisam ser estudados e considerados.
A cidade é, em última análise, um reflexo da sociedade que a habita. Ela deve ser modelada de acordo com as necessidades, desejos e sonhos de seus habitantes, e não apenas de acordo com os interesses financeiros de uma minoria.
Em tempos de crescente privatização do espaço urbano, é vital defender o Direito à Cidade. Que Brasília, cidade símbolo do país, possa ser um exemplo de resistência e reafirmação da interação e da coletividade, garantindo uma cidade viva, participativa e verdadeiramente democrática.
*Rafael Reis é gestor em Políticas Públicas e coordenador-geral do Instituto Cultural e Social No Setor.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
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Edição: Flávia Quirino