Distrito Federal

Médicos em Movimento

Conselho de Medicina do DF elege oposição ‘contra negacionismo’ e ‘pela ciência’

Chapa obteve 30,51% dos votos válidos e posse acontece no dia 1º de outubro

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Mais de 12 mil médicos participaram de votação para escolha de nova diretoria - Reprodução CRM-DF

O Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) elegeu uma nova chapa que vai dirigir a entidade pelos próximos cinco anos, derrotando a antiga diretoria que, durante a pandemia, manteve um posicionamento negacionista alinhado ao Governo Bolsonaro. 

Nomeada de “Movimento: Ciência, Ética e Dignidade”, a Chapa 4 obteve 30,51% dos votos válidos, 3.534 do total de 12.529 votantes, nas eleições realizadas entre os dias 14 e 15 de agosto, defendendo ser “contrária ao carreirismo no CRM-DF”. 

“A nossa era a única chapa de oposição que faz uma defesa incondicional da autonomia médica mas com responsabilidade, baseado em critérios científicos”, defendeu a clínica geral e acupunturiatra Paula Campos Vieira Melo. 


Diferença entre chapa vencedora e segunda colocada foi de 30 votos / Reprodução

Apoiadora da Chapa 4, Arlete Sampaio, médica e ex-deputada distrital pelo Partido dos Trabalhadores (PT) destaca que houve um “racha” na diretoria derrotada, sendo que membros dessa gestão se dividiram, integrando as três outras chapas da disputa eleitoral. A parlamentar descreve ainda que a articulação da oposição em Brasília foi “potente”. 

Fruto de um movimento nacional da categoria médica, “Médicos em Movimento”, que propõe uma discussão sobre o papel da medicina na sociedade, médicos e médicas se juntaram em Brasília, insatisfeitos com a conduta pandêmica da então direção do conselho. 

Felipe Cavalcanti, médico sanitarista e membro da Chapa 4, argumentou que esse movimento “foi uma construção muito coletiva e ampliada, inclusive por pessoas que não compuseram parte da chapa”, descrevendo ainda o processo como “muito rico”. 

“A gente conseguiu reunir médicos que não conversavam há muito tempo”, acrescentou. 

Chefe da medicina do trabalho da região leste de Brasília, Paula Campos Vieira Melo disse que um grupo com mais de 400 médicos foi criado para “conversar sobre condutas negligentes que, na nossa visão, se tratam de irresponsabilidade médica”.

Negacionismo 

Durante a pandemia que matou mais de 700 mil pessoas no país, o  CRM divulgou uma nota em 7 de setembro de 2020, assinada pelo então presidente Farid Buitrago Sanchez, defendendo a “autonomia” médica para prescrição de medicamentos tais como a cloroquina e a hidroxicloroquina, remédios sem benefícios ou comprovação científica para o tratamento contra covid-19. 

Alguns meses depois, em 3 de fevereiro do ano seguinte, o Conselho publicou uma resolução vedando “qualquer tipo de ameaça, coação, discriminação ou assédio moral entre colegas médicos ou por parte de superior hierárquica médico em decorrência de conduta clínica adotada, por médico, frente ao tipo de abordagem do paciente com Covid-19".

Paula Campos Vieira Melo explica que é papel do conselho formular pareceres técnicos respaldando orientações de órgãos internacionais sobre medidas para enfrentar a pandemia, por exemplo, quando a Organização Mundial da Saúde desaconselhou o uso da cloroquina e de ivermectina – medicamento para tratar piolho, cujo consumo foi defendido e incentivado pelo então presidente Jair Bolsonaro. 

“Não incentivou a vacina e autorizou o uso de medicações sem evidências científicas”, resumiu a clínica geral. 

Papel do conselho 

Conselhos de medicina são órgãos cujo papel é fiscalizar para garantir boas práticas e boas condições de trabalho médico. Eles devem “proteger a sociedade contra más práticas e apoiar médicos a terem trabalhos primorosos”, explica Arlete. 

A médica, que foi membro do legislativo do DF por três mandatos, explica que o CRM já teve “excelentes diretorias progressistas” e, mais recentemente, “diretorias negacionistas”. Segundo ela, foi esse contexto que fez com que o movimento de médicos de oposição surgisse. Não apenas em Brasília mas também em outros estados.

Campanha eleitoral 

Nelmy Saad, infectologista e membro da chapa vitoriosa, afirma que a campanha eleitoral foi marcada por “tentativas de interdição da chapa, por polarização e fake news” e que “ocorreram muitos obstáculos”, desde o momento da candidatura da chapa, “com exigências que não cabiam ao processo e que atrasaram a nossa homologação, às várias tentativas de impugnação da chapa, com redução do tempo de campanha”. 

Durante o processo eleitoral, a Chapa 4 chegou a ser proibida pela Comissão Regional Eleitoral do CRM-DF, em 4 de julho, de fazer qualquer divulgação de seus candidatos a membros do conselho médico por 30 dias. A medida foi tomada depois que a Chapa 1 acusou a adversária de fazer campanha antecipada. 

“O que a gente fez foi um movimento, para reunir médicos que têm interesse nas pautas que defendemos. E o movimento transcende as eleições”, argumentou Felipe Cavalcanti. 

Após a Justiça Federal determinar a redução da penalidade de 30 para 10 dias, em 17 de julho, a Comissão Nacional reverteu a decisão por completo, entendendo que não havia ocorrido propaganda antecipada. 

Dois dias após o resultado eleitoral, em 17 de agosto, a Chapa 4 divulgou uma “carta aberta à comunidade médica do DF”: “queremos tranquilizar a todos e todas que nossa gestão será pautada pela inclusão, pelo respeito à democracia e em prol do convívio harmonioso. Desta forma, compreendemos que o momento é de união pela Medicina”, diz o documento. 

A nova diretoria toma posse em 1º de outubro, quando deve indicar membros para os cargos de presidência, vice-presidência, primeira secretaria, segunda secretaria e tesouraria. O mandato vai até 30 de setembro de 2028.

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Edição: Flávia Quirino