O ex-deputado federal e ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), José Genoíno, esteve em Brasília nesta quarta-feira (6) para participar de debate durante o lançamento do livro “O que fazer com o militar”, de Manuel Domingos Neto. O encontro aconteceu no Centro Cultural da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (ADUnB).
Em entrevista ao Brasil de Fato DF, o ex-guerrilheiro do Araguaia falou do cenário político nacional e da participação dos militares no governo Bolsonaro e nos atos de 8 de janeiro.
Na avaliação de Genoíno, apenas os militares de baixo escalão estão sendo responsabilizados. “Tem que haver uma resposta à sociedade sobre aqueles acontecimentos do 8 de janeiro”, defendeu ao dizer que é necessário exigir uma investigação séria, respeitando o “devido processo legal”. Além disso, criticou a permissividade com que o governo atual tem aceitado a interferência de militares.
Segundo Genoíno, para enfrentar um Congresso conservador e “uma espécie de revanche” da extrema-direita nas eleições municipais de 2024, é necessário uma “disputa politizada” e de “defesa da plataforma popular”.
Confira a entrevista completa.
Brasil de Fato DF - Como avalia esse cenário político nacional que estamos vivendo atualmente, mais especificamente em relação aos desafios do governo tendo em vista esse Congresso de maioria de extrema e centro direita?
Eu acho que o governo tem que deixar mais claro qual é a plataforma, quais são os seus objetivos para concretizar o programa que elegeu Lula. E eu acho que isso envolve o compromisso com a mobilização da sociedade, com o debate com a sociedade, porque se ficar dependendo só do Congresso, fica muito amarrado à maioria conservadora. O governo tem que dialogar com as entidades, com os movimentos, com os partidos de esquerda para fazer um debate que envolva a sociedade. Esse é o grande desafio que nós temos pela frente.
Durante o evento de lançamento do livro, você falou sobre a participação dos militares, tanto no governo Bolsonaro, quanto no 8 de janeiro, e que o senhor considera que o relatório da CPI foi um relatório bom, mas que não foram punidos os militares do alto escalão. Qual é a avaliação do senhor sobre isso?
Para mim é uma questão que está para ser resolvida. Quer dizer, vão ser punidos? Vão ser investigados? Quem mandou? Quem articulou? Nós não podemos ter uma investigação que se reduza ao que eu chamei 'andar de baixo'. O que aconteceu no país foi extremamente grave, não só as tentativas de golpes, a principal delas foi o 8 de janeiro, e na medida em que esse processo está na justiça, nós devemos exigir investigação, respeitando o devido processo legal, respeitando o direito de defesa, respeitando a presunção da inocência, mas deve ser julgado sim. Tem que haver uma resposta à sociedade sobre aqueles acontecimentos do 8 de janeiro.
Você mencionou que a gente perdeu a oportunidade de fazer uma reforma política depois de todos os acontecimentos envolvendo os militares no governo e no 8 de janeiro. Que reforma seria essa?
A gente poderia ter tomado medidas mais efetivas, no sentido de reformular, no sentido de colocar novas diretrizes, no sentido de definir claramente os rumos do Brasil daqui pra frente, principalmente o primado da democracia, o primado do respeito à soberania popular, o primado da reconstrução do país, da transformação, o primado de passar o Brasil a limpo diante de tudo que foi feito e foi destruído nos anos do Bolsonaro.
Como avalia a participação dos militares nesse começo do novo governo?
Eu tenho uma crítica à maneira como o governo aceita a influência, o que eu chamo de tutela, de interferência dos militares. Há uma influência em demasia desse processo na reestruturação do governo. Eu acho que podia ter feito mais mudanças e que inclusive o debate sobre as novas diretrizes da política de defesa poderia estar se dando com a sociedade.
E sobre o avanço da extrema-direita na América Latina, tendo em vista a menção que fez ao Brasil como um importante ator nesse novo arranjo multilateral do mundo, como avalia esse cenário?
O que está claro: quando a esquerda chega ao governo e não atende às reivindicações populares, não atende às transformações e às mudanças, abre o terreno para o crescimento da extrema direita. Está aí o exemplo da Argentina, do Chile, do Peru, do Equador. Portanto, nós temos que realizar um programa de transformação e de reconstrução para atender à população, à classe trabalhadora, aos movimentos sociais como das mulheres, o movimento da juventude, o movimento do povo negro, o movimento da comunidade LGBTQIA+, o movimento das populações originárias. Nós temos que realizar mudanças. A gente não pode se acomodar diante de uma institucionalidade que no meu modo de entender está profundamente viciada.
quando a esquerda chega ao governo e não atende às reivindicações populares, não atende às transformações e às mudanças, abre o terreno para o crescimento da extrema direita.
Considerando as eleições municipais do próximo ano, quais são as projeções?
Vai ser uma eleição muito disputada. A extrema direita vai vir para uma espécie de revanche e nós temos que fazer uma disputa politizada, de defesa do governo Lula, mas ao mesmo tempo de defesa da plataforma popular das grandes cidades, nas médias e pequenas cidades, e eu acho que a gente via priorizar uma aliança com as forças progressistas à esquerda.
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Edição: Márcia Silva