O Distrito Federal enfrenta grave crise de saúde devido ao aumento alarmante do número de casos de dengue. A incidência da doença no ente federativo é nove vezes maior que a nacional, segundo dados do Ministério da Saúde. A situação coloca hospitais, unidades e profissionais de saúde sob pressão e levanta questionamentos sobre a demora da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) em convocar servidores aprovados em concursos.
Segundo resposta da Secretaria, obtida por meio da Lei de Acesso à informação, há atualmente um déficit de 1.460 enfermeiros na rede pública de saúde. A falta de pessoal, aliada à sobrecarga daqueles que estão em atuação e à explosão de casos da dengue, faz com que os usuários se queixem do atendimento e da superlotação das unidades de saúde, como mostrou o Brasil de Fato DF.
“O concurso de Enfermeiros Generalistas foi homologado em setembro de 2022 e desde então recebemos promessas de nomeações, mas nunca cumpridas. A única nomeação que tivemos foi em fevereiro de 2023, com um número bem menor do que a real necessidade da rede pública. Hoje, quase um ano depois das primeiras e únicas nomeações, ainda não preenchemos nem 1/3 das vacâncias e nem temos previsão de uma próxima nomeação”, contou à reportagem uma aprovada no concurso, que preferiu não se identificar.
Números alarmantes
Segundo o Painel de Monitoramento das Arboviroses do Ministério da Saúde (MS), atualizado nesta quarta-feira (31), o DF tem a maior incidência de casos prováveis de dengue do país, com 1.108 infecções a cada 100 mil habitantes. O número é nove vezes maior que a incidência nacional, que é de 120, e quase três vezes maior que a de Minas Gerais, com 384, que está em segundo lugar no ranking e também decretou situação de emergência na saúde em razão da doença.
Além disso, houve um crescimento de 1.032% nos casos de dengue em comparação a janeiro do ano passado, quando foram registrados 2.691. No mesmo mês de 2024, foram computados 30.305 casos prováveis no DF, segundo Boletim Epidemiológico divulgado pela SES-DF nesta quinta (1º).
O Painel do MS também aponta que neste ano, até agora, houve 24 mortes pela infecção confirmadas no Brasil, sete delas no DF, onde outros 23 óbitos suspeitos são investigados.
Segundo o Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal (SindEnfermeiro-DF), a situação demonstra a “falta de planejamento do GDF [Governo do Distrito Federal] em relação à saúde”, já que a possibilidade de uma epidemia de dengue já havia sido levantada pelo MS em 2023. “Afinal, quantas epidemias ainda vamos ter que enfrentar até o GDF fortalecer a rede pública de saúde e a vigilância epidemiológica?”, questionou o grupo.
Resposta dada pelo GDF é “medida paliativa”
Em 25 de janeiro, o GDF decretou situação de emergência na saúde pública do DF em razão do risco de epidemia de dengue. No decreto, o governo autorizou a contratação de pessoal “por tempo determinado, com a finalidade precípua de combate à epidemia”. A medida é criticada por entidades ligadas à saúde.
:: Sindicato e parlamentares criticam decreto de emergência na saúde no DF ::
“Esta medida paliativa somente facilita ações do governo sem nenhuma licitação, e não enfrenta o problema em sua raiz”, afirma a diretora do SindEnfermeiro-DF, Ursula Nepomuceno. Na mesma linha, a concursada ouvida pelo Brasil de Fato DF considera a medida uma forma de “tapar o sol com a peneira”.
O cenário ideal, de acordo com Ursula, é nomear os aprovados no concurso vigente, em vez de dar preferência para contratos temporários.
“São milhares de enfermeiros, técnicos de enfermagem, agentes comunitários e de vigilância ambiental que estão aguardando há anos por uma simples nomeação no Diário Oficial, mas que ao invés de servir a população estão tendo que ir às ruas lutar pelo direito de trabalhar”, cobrou o Sindicato, em postagem.
Outra medida tomada pelo GDF foi a convocação de cerca de 250 militares do Comando Militar do Planalto para atuar na condução de veículos de fumacê e ambulâncias e em visitas domiciliares e inspeções.
“Contratos temporários, apoio do exército, dos bombeiros, dos voluntários, dos estagiários e estudantes são apenas medidas paliativas. A necessidade de repor o quadro vem sendo discutida muito antes desse caso sazonal (dengue), inclusive têm cuidados de enfermagem privativo do enfermeiro onde o exército e bombeiros não poderão atuar”, ponderou a concursada ouvida pela reportagem.
Além disso, o governo instalou tendas de acolhimento e hidratação de pessoas com dengue em nove Regiões Administrativas do DF. Nesta quinta-feira (1º), o secretário da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha, anunciou a criação de um hospital de campanha da Força Aérea Brasileira (FAB) no DF.
A transferência de enfermeiros e técnicos de enfermagem para atuar nas tendas de acolhimento emergencial tem desfalcado as equipes de Saúde da Família nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). “O que prejudica também a procura pelos atendimentos de demanda espontânea”, explicou o SindEnfermeiro-DF. As visitas domiciliares a idosos e acamados também têm sido afetadas.
O governo informou que o hospital de campanha será instaurado em regiões que apresentam o maior número de casos. Atualmente, Ceilândia, Pôr do Sol e Sol Nascente concentram 40% dos casos. Serão 60 leitos, com funcionamento 24 horas. A estratégia para a utilização do hospital, inclusive local e data de funcionamento, ainda está em estudo pelo GDF e pela FAB.
Frustrações recorrentes
Em 2023, havia uma previsão orçamentária para 600 nomeações de enfermeiros aprovados em concurso. Apesar disso, pouco mais de 200 profissionais foram chamados.
Neste ano, a preocupação é maior, já que o governador Ibaneis Rocha vetou uma série de emendas parlamentares à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que previam as nomeações dos aprovados em concursos de diversas pastas.
Os deputados progressistas, que fazem oposição a Ibaneis na Câmara Legislativa do DF (CLDF), aguardam que a votação dos vetos ocorra em breve, com a retomada dos trabalhos legislativos nesta quinta-feira (1º).
“No ano passado o que estava previsto na LDO não foi cumprido para as nomeações e a gente não teve um posicionamento independente da Câmara na derrubada dos vetos. E a situação este ano é ainda mais preocupante”, destacou a deputada distrital Dayse Amarílio (PSB).
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Edição: Márcia Silva