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O Dia Internacional de Luta pela Terra e as universidades: a experiência da UnB

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"São inúmeros os projetos de extensão e pesquisa que envolvem equipes da UnB, de diversos cursos, com comunidades e territórios camponeses e quilombolas em diversas regiões do país." - Kaick Carvalho, Greiciane Souza e Daniel Violal
A UnB tem buscado acolher as demandas dos povos do campo, das águas e das florestas

No 17 de abril comemoramos o Dia Internacional de Luta pela Reforma Agrária. A data foi escolhida em razão do massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 17 de abril de 1996, em que vinte e um camponeses sem terra foram assassinados e mais de sessenta ficaram feridos, na curva do S, na estrada que liga Marabá a Parauapebas, no Pará.

Do luto à luta: este foi o movimento que levou as trabalhadoras e os trabalhadores rurais sem terra a protestos em escala nacional e internacional, cobrando justiça contra os assassinos da força policial militar e dos mandantes, e celeridade na demarcação de terras para Reforma Agrária e liberação de créditos para plantio e infraestrutura das áreas reformadas. Em 1997 o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizou uma histórica marcha que, na chegada à capital, foi recebida por cerca de 100 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios.

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Desde aquele contexto, a Universidade de Brasília tem buscado acolher as demandas dos povos do campo, das águas e das florestas, e procurado contribuir com produção de conhecimento e a elaboração de subsídios às políticas públicas nesta área. Foi assim que, em 1997, foi realizado na UnB, protagonizado pelo Setor Educação do MST, o I Encontro Nacional de Educação na Reforma Agrária e, no ano seguinte, com intensa participação da Universidade, foi criado o Programa Nacional de Educação e Reforma Agrária (PRONERA), ligado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e ao INCRA. Tal Programa consolidou-se como um das principais políticas públicas de Educação do Campo do país e é responsável pela formação de milhares de camponeses em todo o Brasil, por meio de cursos em parceria com universidades e movimentos sociais, desde a escolarização de jovens e adultos até a oferta de graduação e pós graduação em diversas áreas.

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Em quase três décadas de trabalho importantes iniciativas se desdobraram na UnB: o Grupo de Trabalho de Apoio à Reforma Agrária, que desenvolveu dezenas de projetos de extensão em âmbito regional e nacional; no Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares foi criado o Núcleo de Estudos Agrários (Neagri), que integra pesquisadores de várias unidades acadêmicas; na Faculdade de Direito, o Projeto Direito Achado na Rua tem uma valiosa frente voltada para Direito Agrário e luta pela terra; na Faculdade UnB Planaltina, foi criada em 2007, como experiência piloto, a oferta da Licenciatura em Educação do Campo (LEdoC) concebida para garantir a formação educadores(as) que já atuam nas escolas do campo e da juventude camponesa que nelas possa vir a atuar.

Acompanhada de muitas pesquisas produzidas pela UnB durante sua execução, esta experiência piloto consolida-se como uma política pública nacional. As LEdoCs são ofertadas atualmente em 39 universidades e institutos federais, com 59 cursos permanentes, nos quais estão matriculados 6.800 estudantes oriundos de variados territórios rurais de todo país.

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No tempo presente, são inúmeros os projetos de extensão e pesquisa que envolvem equipes da UnB, de diversos cursos, com comunidades e territórios camponeses e quilombolas em diversas regiões do país. Na pós-graduação da UnB há diversos programas em que a questão agrária é objeto de estudo sobre diferentes aspectos: políticos; econômicos; educacionais; ambientais; culturais e artísticos. Dentre eles cabe citar o PPG em Educação da FE; o PPG em Artes Cênicas e o Mestrado Profissional do IdA; os PPGs em Literatura e Linguística do IL; o PPG em Direitos Humanos, do Ceam; o PPG em Sociologia do ICS; o PPG em Geografia do ICH, o PPG em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural da FUP, o PPG em Sustentabilidade e Povos Tradicionais ofertado pelo CDS\MADER, entre outros.

Centenas de estudantes camponeses, quilombolas e indígenas encontram nestes programas a oportunidade de aprofundamento de seus estudos e qualificação profissional, trazendo inúmeras contribuições aos seus territórios, bem como trazendo também expressivas contribuições à universidade, que tem aprendido a ressignificar os modos de produção do conhecimento, em diálogo com sabedoria e a ancestralidade destes diversos povos.

É extremamente relevante o processo em andamento da parceria entre a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade Agrícola da China (CAU), para a construção do Centro Brasil-China de Pesquisa, Desenvolvimento e Promoção de Tecnologia em Mecanização para Agricultura Familiar. O referido Centro terá papel estruturante na produção de conhecimento para o desenvolvimento da Agricultura Familiar no Brasil, setor fundamental na produção agrícola, sendo responsável por mais de 70 % dos alimentos que chegam à nossa mesa.

E, desde 2013, nos meses de abril e maio, realiza-se, a Jornada Universitária de Apoio à Reforma Agrária – a JURA, evento nacional reproduzido em mais de cinquenta universidades do Brasil, e também em Portugal e na Argentina. A JURA consiste num conjunto de ações articuladas a partir das IES em parceria com outras organizações e movimentos sociais, visando a defesa da Reforma Agrária e da educação pública, como bases para construção de um projeto popular para o país. Como parte das ações desta Jornada Nacional são realizados seminários, oficinas, lançamentos de livros e atividades culturais nas IES, e são ainda realizadas vivências em assentamentos e acampamentos, com o intuito de fortalecer os vínculos da universidade com a luta pela terra e em defesa do projeto da Reforma Agrária Popular.

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Que nesta data histórica, possamos avançar na elaboração de projetos de ensino; pesquisa e extensão que sigam inserindo a questão agrária na pauta da academia e contribuindo com a elaboração de subsídios e políticas públicas que fortalecem a execução da Reforma Agrária Popular e que auxiliem a ampliação do reconhecimento dos movimentos sociais populares do campo como sujeitos coletivos de produção do conhecimento e a legitimidade de suas lutas em defesa da qualidade da alimentação do povo brasileiro e da democratização da terra, da educação, da cultura e da comunicação.

Relacionamos abaixo links de acesso para episódios de programas da UnBTV que repercutem algumas das iniciativas mencionadas no texto:

Episódio sobre “Direito à terra” do Programa Brasil em Questão

Episódio “A universidade camponesa: a Licenciatura em Educação do Campo” do Programa “Universidade para quê?”

Episódio “A universidade e os povos tradicionais” do Programa “Universidade para quê?”

Reportagem “Curso de Licenciatura em Educação do Campo completa 15 anos"

Reportagem “FUP sedia a V Mostra Terra em Cena e na Tela

Reportagem “UnB fecha parceria com universidade chinesa para combate à fome”

Playlist com os seis episódios da série Floresta de Gente

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*Mônica Castagna Molina é professora associada dos programas de Pós-Graduação em Educação e de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural. É doutora em desenvolvimento sustentável pela UnB.

**Rafael Litvin Villas Bôas é professor da Licenciatura em Educação do Campo na Faculdade UnB Planaltina. Coordena o grupo de pesquisa Terra em Cena: teatro, audiovisual e educação do campo.

***Reinaldo José de Miranda Filho é doutor em Fitopatologia e professor pela Universidade de Brasília. Atualmente diretor da Faculdade UnB Planaltina (FUP).

****Artigo publicado originalmente no portal de noticias da Universidade de Brasília, no dia 17 de abril de 2024.

*****Este é um artigo de opinião. A visão da autora e dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

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Edição: Márcia Silva