Mário Juruna foi o primeiro indígena eleito deputado federal no Brasil, em 1983. Ao longo dessas quatro décadas a demarcação dos territórios indígenas continua como pauta prioritária, mas outras demandas emergiram, como o aumento da participação de indígenas na política.
Desde 1986, quando o xavante Mário Juruna finalizou o mandato, o parlamento brasileiro só foi ocupado novamente por uma indígena em 2018, quando Joenia Wapichana, de Roraima, se tornou a primeira mulher indígena eleita deputada federal. A conquista de Juruna foi lembrada nesta sexta-feira (26) pela deputada federal Célia Xacriabá (Psol-MG) no debate sobre "Aldear a Política: Reparações e Ações afirmativas", que integrou a programação do Acampamento Terra Livre e tratou a respeito da participação de indígenas nos processos eleitorais do país.
Nas eleições de 2022, das 175 candidaturas de pessoas indígenas apenas cinco foram eleitos: Célia Xacriabá (Psol-MG), Juliana Cardoso (PT-SP), Paulo Guedes (PT-MG), Silvia Waiãpi (PL-AP) e Sônia Guajajara (Psol-SP), atual ministra dos Povos Indígenas. Waiãpi diverge política e ideologicamente dos demais, que já passaram a ser chamados de “bancada do cocar”.
"Nós entendemos que o principal resultado das eleições não é somente ganhar nas urnas, quando nós concorremos as eleições combatemos o racismo, porque quem vota em indígenas vota na luta dos povos indígenas”, destacou Célia Xacriabá, que recebeu 101 mil votos em sua primeira disputa eleitoral.
A Deputada é autora de uma consulta ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para que candidaturas indígenas registradas por partidos e federações partidárias contem com distribuição proporcional, nos mesmos moldes estabelecidos às pessoas negras, de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, denominado Fundo Partidário, e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), além de tempo gratuito de rádio e televisão.
A consulta foi analisada favorável pelo TSE em fevereiro deste ano e o tribunal realizará estudos de impactos para a regulamentação do tema e analisará a implementação nas Eleições de 2024 ou em 2026.
“No TSE, nós conseguimos uma vitória importante. Na nossa candidatura tivemos 10 segundos de tempo de televisão, não tínhamos fundo partidário para a questão indígena, concorremos como candidaturas brancas, tínhamos apenas uma pequena cota porque éramos mulheres. Agora estamos na luta para que seja regulamentado ainda nesta eleição, mas nas eleições de 2026 terá candidatura indígena com condição de chegar no parlamento brasileiro porque terá tempo de tv e rádio, assim como o fundo partidário”, avaliou a parlamentar, que encorajou a plenária a participar das eleições municipais. “E àquelas pessoas que no seu local, quando você for pedir apoio falarem que é cedo demais, falar para você esperar outro ano, pergunta se 524 anos é cedo. Quando falarem: será que vocês vai ganhar? Nós povos indígenas ganhamos porque entendemos que a única forma de combater o racismo é se fazendo presente nesse lugar, não perde aquele que tá junto do povo, não perde quem entra no projeto político da coletividade”, ressaltou.
Primeira mulher indígena eleita deputada federal e primeira presidenta indígena da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Joenia Wapichana falou da importância do debate das políticas públicas com a participação de indígenas. “Muitas vezes falavam que essa questão de política não nos interessa, porque é coisa do branco, por muito tempo ouvíamos isso, mas depois nós ficamos refletindo: o que é essa política? O que é a necessidade dos povos indígenas, porque se você não participa dessa discussão alguém vai discutir por nós. Temos o direito de votar e ser votado”, destacou.
Também eleita em 2022, com 156 mil votos, Sônia Guajajara é a primeira indígena ministra de estado do país. “A gente chega não só para ocupar um cargo, para ter uma presença física. A nossa chegada representa também o início da quebra desse racismo estrutural provocado pela ausência das representações indígenas nesses espaços. A nossa falta promove esse racismo institucional e estrutural presente até hoje. E por isso que quando a gente chega, promovemos o diálogo”, destacou.
Papel das Eleições Municipais 2024
Sônia Guajajara defendeu uma maior participação dos “parentes” na política partidária e lembrou dos retrocessos que Congresso Nacional tem aprovado nos últimos anos contra os povos indígenas, como o marco temporal para as demarcações. “É muito importante que o movimento indígena siga unido. A força do governo é uma, a força do movimento é outro”.
“Esse país não teria a mesma credibilidade internacional se não tivesse hoje a presença indígena compondo esse governo, então nós contribuímos para o fortalecimento da democracia. Estamos aqui para falar que queremos aumentar a presença de indígenas no parlamento, nos ministérios, nas prefeituras e também nas assembleias legislativas. Avançamos com indígenas no parlamento federal, mas ainda temos ausência de indígenas nas assembleias legislativas", observou a ministra.
Para Sônia Guajajara é necessário que os povos indígenas fortaleçam as candidaturas nos municípios. "Nas eleições municipais, precisamos eleger vereadores, vereadoras, prefeitos e prefeitas, precisamos fazer a nossa base eleitoral para 2026, eleger deputados estaduais e aumentar a bancada do cocar no Congresso Nacional. Não podemos mais permitir que ignorem a nossa presença”, ressaltou.
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Edição: Flávia Quirino