A jovem Fabiana Andrade interrompeu seus estudos no 1º ano do ensino médio para trabalhar e só agora (em 2024) conseguiu voltar a estudar, depois de quatro anos fora da sala de aula. Ela é uma jovem negra e seu caso contribui com a estatística de que pessoas pretas e pardas (negras) estudam em média 11,5 anos, enquanto as brancas 12,8 anos no Distrito Federal, conforme dados da educação da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua sobre 2023. A desigualdade na educação é um dos problemas para a população negra após 136 anos do fim na escravidão no Brasil, marcado em 13 de maio.
A pesquisa começou a ser feita em 2016 e nesses sete anos houve uma diminuição entre a diferença de anos nas escolas de pessoas brancas e negras (pretas e pardas). No primeiro ano da pesquisa, pessoas brancas estudavam em média 2,2 anos a mais que as negras no DF. Atualmente essa média caiu para 1,3 anos. O Distrito Federal é a unidade da federação, com o maior média de anos de pessoas negras na escola (11,5 anos), sendo a média nacional de apenas 9,5 anos. No entanto, enquanto a média nacional de pessoas brancas na escola é de 10,9 anos, no DF esse índice chega a 12,8 anos – o maior da pesquisa.
“Eu tive que sair da escola basicamente porque o dinheiro da minha mãe, que é sozinha, não estava dando para manter a casa e todo lugar que eu procurava trabalho queriam o dia todo. Então tive que sair”, narrou Fabiana, que hoje tem 23 anos, é morada da Ceilândia. “Eu sei que o estudo é o melhor caminho e quero fazer faculdade de enfermagem”, afirmou a jovem que atualmente está no 3º ano do ensino médio.
Para a diretora de Assuntos de Raça e Sexualidade do Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF), Márcia Gilda, a explicação para esta realidade, em que pessoas negras estudam menos que brancas, vem de um conjunto de fatores, que vão desde uma maior disponibilidade de escolas no centro de Brasília até os fatores sociais e históricos. “Devido às diferenças de renda, existe uma grande pressão para que os jovens negros adentrem mais cedo no mercado de trabalho. Olhando todos esses elementos podemos chamar esse fenômeno de racismo estrutural, ou seja, esse conjunto de barreiras que atrapalham o progresso da vida escolar dos jovens negros”, explicou Márcia.
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Na avaliação da sindicalista, o poder público precisa primeiramente compreender que estamos tratando de um fenômeno estrutural e então apontar medidas estruturais como a construção de mais escolas públicas e valorização do magistério para atuação nas periferias. “Programas como o 'Pé-de-meia', recém-lançado pelo governo federal, também são bem-vindos, pois geram um incentivo econômico para que os jovens permaneçam na escola”, lembrou Márcia, destacando que também são necessárias mais ações sociais que combatam as desigualdades que empurram esses jovens para a evasão escolar.
“Essa realidade além de ajudar a perpetuar o racismo, também é resultado do próprio racismo e quebrar esse ciclo contribui para diminuir a desigualdade racial em nosso país”, analisou a diretora do Sinpro, acrescentando: “entender que as raízes desse problema tem a ver com a histórica segregação da população negra, nos ajuda a lutar por medidas reparatórias em todos os campos, não apenas na educação”.
Educação antirracista
A lei nº 10.639, que institui a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileiras nas escolas, foi criada em 2003 e ainda encontra entraves para ser completa implementada no Distrito Federal, conforme destacou a professora Neliane Maria, integrante da Frente das Mulheres Negras do DF e do Fórum Distrital de Educação (FDE).
"A implementação do artigo 26º da LDB, conforme alteração trazida pela Lei 10.639, torna obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena na educação básica. Sua aplicabilidade exige pensar e fazer uma educação para todas e todos, do financiamento ao currículo, da gestão escolar à formação continuada, fazendo com que as escolas sejam acolhedoras e transformadoras", afirmou Neliane, destacando a importância da medida no combate ao racismo e evasão escolar da população negra.
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"Os dados apontam a desigualdade racial e o racismo estrutural da sociedade, não só na educação, mas também no acesso e permanência ao emprego, saúde, moradia e direitos básicos", analisou a militante da Frente Mulheres Negras ao falar dos dados da Pnad Continua, acrescentando: "Os números também denunciam uma educação que não funciona conforme rege a LDB".
Secretaria de Educação
Em nota, a Secretaria de Educação do DF afirmou que está comprometida com a erradicação do analfabetismo das pessoas a partir dos 15 anos, por meio de “abordagens amplas e inclusivas”, como a Educação de Jovens e Adultos (EJA). “A Secretaria busca atender a população de maior vulnerabilidade, com a oferta descentralizada de EJA e com a possibilidade de matrícula a qualquer tempo, nas 99 unidades escolares de EJA, distribuídas nas 14 Coordenações Regionais de Ensino”.
“A SEEDF espera que suas políticas e iniciativas contribuam para a redução do analfabetismo de forma geral. Isso sugere uma visão holística que visa abordar as causas subjacentes do analfabetismo e promover a inclusão educacional em toda a comunidade”, acrescentou a Pasta destacando que tem como um compromisso com a educação inclusiva e o combate ao analfabetismo, para toda a população do DF.
O Brasil de Fato DF também encontrou em contato a Secretaria de Justiça e Cidadania (que tem na estrutura a Subsecretaria de Igualdade Racial) para comentar os dados e apontar políticas públicas para reduzir essa desigualdade raciais no DF, mas a Pasta não respondeu.
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Edição: Márcia Silva