Distrito Federal

Educação no DF

Uso de detectores de metal em escolas é transformar estudantes em suspeitos, diz especialista

Catarina Santos lembra que escolas vivem reflexo da violência da sociedade; deputados também criticam GDF

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Secretaria promete edital para a aquisição dos equipamentos em 40 dias - Felipe de Noronha/SEE-DF

As escolas públicas do Distrito Federal deverão contar com detectores de metais e sistema de reconhecimento facial, foi o que anunciou a Secretaria de Educação do DF (SEEDF). O comunicado provocou fortes críticas de deputados distritais durante sessão da Câmara Legislativa (CLDF) desta terça-feira (14). Especialista ouvida pelo Brasil de Fato DF destaca dificuldades operacionais para a implementação dos detectores e os diversos outros problemas que a medida pode causar, desde o aumento do racismo até a descaracterização das instituições de ensino, que vivenciam o reflexo da violência da sociedade.  

“A escola tem sido cada vez mais um espaço de aprisionamento, de restrição de processo de formação. A cada novo episódio de violência, a reação da nossa sociedade, especialmente dos gestores públicos, é tentar transformar a escola cada vez menos em um espaço da diferença e cada vez mais em um espaço de aprisionamento”, destacou a pesquisadora e professora Catarina de Almeida Santos da Universidade de Brasília (UnB).

Para a pesquisadora, a discussão sobre o uso de detectores de metais nas escolas envolve um “conjunto de problemas”, que vão desde o operacional até a dificuldade da sociedade em encarar estas questões como elas realmente precisam ser vistas. "Vamos fazer com que nossos estudantes, por conta de casos de violência, passem por esse processo de constrangimento, de filas enormes na entrada da escola, e fazer com que cada estudante da escola se torne um suspeito em relação à instituição, em relação aos seus colegas", questionou a especialista.

Catarina ainda chamou atenção para o problema da discriminação racial, que coloca pessoas negras em situações de mais constrangimento ou abusos. “A gente sabe quem são as pessoas que, na nossa sociedade, tem 'a cara', 'o corpo' e 'o comportamento' de alguém que é um 'delinquente', de alguém que ameaça a segurança dos demais. São meninas e, sobretudo, meninos negros, que tem características culturais específicas, por usar capuz, pelo cabelo ou pela forma como andam”, destacou.

De acordo com a professora da UnB, felizmente, as escolas manifestam violência em menor quantidade que a própria sociedade, o que aponta que o problema precisa ser enfrentado como um todo, já que não é uma particularidade das instituições de ensino. “Quando o governo diz que a saída é instalar detector de metal, ele não olha para essa escola que tem infraestrutura”, defendeu Catarina, acrescentando: “com muros, grades, detectores de metais, coleta de informações, câmeras de segurança é transformar cada vez mais em instituições parecidas com prisões e cada vez menos com escola”.


Pesquisadora Catarina Santos em homenagem na CLDF com deputado Fábio Félix / Reprodução: Catarina de Almeida Santos

Por fim, a especialista defende a escola como lugar de formação e também lembra que, em nenhuma outra instituição, as pessoas passam mais de 200 dias, sendo, no mínimo, quatro horas juntas, convivendo com as "diferenças de ordem social, econômica, política, racial e de gênero". Segundo Catarina, precisamos "transformar a escola cada vez mais em escola, em espaço de construção de respeito, de diálogo, para que as pessoas aprendam a lidar com essas diferenças. Em um local de não violência, inclusive violência simbólica".

Repúdio dos deputados

A aquisição de detectores de metais e a contratação de serviços de reconhecimento facial pela Secretaria de Educação foi um dos principais assuntos discutidos na CLDF. Os deputados de oposição ao governador Ibaneis Rocha (MDB) criticaram o Governo do Distrito Federal (GDF) pela proposta e apontaram os diversos problemas da educação publica no DF.

“Os estudantes não têm nem uniforme escolar, que é um elemento de segurança. Quero saber quanto vai custar a instalação dos detectores de metais”, afirmou o líder da oposição, deputado Gabriel Magno (PT).

Já o deputado Fábio Felix (PSOL), criticou a Secretaria de Educação por não se ater aos dados da realidade. “É preciso olhar as evidências. Não adianta colocar detector de metal, essa é uma proposta simplista, que não passou por pesquisadores e professores”, destacou o deputado.

Para o deputado Max Maciel (PSOL), é preciso aprofundar os estudos sobre as razoes da violência nas escolas. “Antes de cometer violência, o jovem dá vários sinais, se isola dos amigos, fica irritado”, argumentou o parlamentar ressaltando a precariedade das escolas do DF, com o déficit de profissionais. 

Secretaria de Educação

Em nota, a Secretaria de Educação do DF (SEEDF) comunicou a futura aquisição de detectores de metais para todas as escolas públicas do DF e justificou que a medida “faz parte de um compromisso contínuo com a segurança de nossos estudantes e professores, reforçando o ambiente educacional como um espaço seguro e protegido”.

Ainda segundo a SEEDF, a introdução dos detectores de metais é uma “resposta proativa para aumentar a segurança nas escolas, visando prevenir a entrada de armas de fogo e armas brancas nos estabelecimentos de ensino”. Segundo a nota, a iniciativa visa completar ações pedagógicas que a Secretaria já estaria realizando para assegurar que as escolas do DF “permaneçam ambientes de aprendizado seguros e acolhedores”.

A pasta ainda informou que o edital para a aquisição dos equipamentos será publicado dentro de 40 dias, por meio de processo licitatório. “A SEEDF está empenhada em conduzir um processo transparente e eficaz para garantir que nossas escolas sejam equipadas com tecnologia de ponta em segurança”, acrescentou a Pasta.

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Edição: Rafaela Ferreira