No Brasil, Nise da Silveira ganhou destaque como psiquiatra que defendia tratamentos humanizados, criticava métodos violentos, como o eletrochoque, e introduziu tratamentos que envolviam contato com animais domésticos e expressões artísticas. O Movimento Sanitário e o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental lideraram a iniciativa, envolvendo também familiares de pacientes e, em 18 de maio de 1987, foi realizado um encontro que consagrou essa data como o Dia da Luta Antimanicomial no Brasil.
37 anos depois, o Fórum Revolucionário Antimanicomial do DF realizou, neste sábado (18), o segundo ato da agenda unificada em Defesa da Saúde Mental no SUS, em frente ao Hospital São Vicente de Paulo, em Taguatinga. O Lugar é referência em violação de direitos humanos na capital federal.
Estudantes, profissionais da saúde, ativistas, usuários do SUS e assistentes sociais protestaram por ações efetivas do governo Ibaneis Rocha (MDB) em relação ao Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS) e questionaram as comunidades terapêuticas que estão na mão de religiosos, a verba destinada a essas comunidades, o fortalecimento da Rede de Proteção Psicossocial (RAPS), e o Cuidado e Liberdade, que são direitos democráticos.
Pedro Costa, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), coordenador do Grupo Saúde Mental e Militância no DF e integrante do Fórum Revolucionário Antimanicomial do Distrito Federal, explica que o ato tem um objetivo bem específico, que é denunciar a existência do São Vicente de Paulo.
“Nem todo mundo sabe, mas o São Vicente de Paulo desde 1999, é um hospital não só para psiquiátricos, ele não é só um manicômio público, ele é ilegal! A gente tem a lei 975/95 aqui do Distrito Federal, que em determinado momento ela deu um prazo de 4 anos para que o GDF fechasse os leitos psiquiátricos, os hospitais psiquiátricos como o São Vicente de Paulo e fechassem essas instituições. Desde dezembro de 99, que completou esse prazo, o São Vicente é um hospital psiquiatrico ilegal, aqui em Brasília. A gente só não tem mais leitos em hospitais gerais, a gente só não tem mais CAPS do tipo 3, que é aqueles que fazem acolhimento de todo mundo, porque a gente tem o São Vicente de Paulo ainda trazendo essa demanda pra si, só que numa perspectiva manicomializante, porque ele é um manicômio. Queremos a cobertura da rede de atenção psicossocial para que isso se mantenha. Pedimos mais leitos, enfermarias em hospitais gerais, mais caps 3, inclusive, residências terapêuticas que a gente não tem nenhuma aqui em Brasília”, defendeu o professor.
José Alves Ribeiro, usuário do SUS e presidente do Clube dos Amigos do Instituto Federal em Ação, conta que tudo começou como uma reunião de pacientes de saúde mental. Hoje ele é um grupo conhecido no Brasil inteiro e não agrega só pessoas da saúde mental, mas sim todas aquelas que aderem o significado à luta pela melhoria da saúde mental.
“O clube nasceu aqui dentro desse hospital, infelizmente nasceu de uma luta já da gente aqui dentro desse hospital. Eu criei essa ideia que nós tínhamos que mudar o conceito do paciente chegar aqui e ser tratado apenas como um paciente qualquer. Na época, a gente fez isso apenas para paciente e isso foi tomando proporção. As pessoas foram conhecendo melhor o serviço, conhecendo melhor a nossa luta, a nossa atividade. Não tem tratamento de verdade ali. Eu fui amarrado, fui roubado aqui dentro.Cheguei aqui, passei mal, me deram uma injeção. Dormi, quando eu saí, saí com duas moedas e vinte centavos no meu bolso”, contou Ribeiro.
Quem mais precisa de assistência é quem mais sente a precariedade da rede de atendimento à saúde mental pelo SUS no DF. É caso de Clara Gomes, ex-corredora de rua, poetisa e usuária do SUS há pelo menos duas décadas, que foi parar no São Vicente de Paulo por tentativa de suicídio.
“As pessoas acham que é uma piada o que a gente tá fazendo aqui. Hoje eu presenciei um enfermeiro dizendo que agora a gente tá numa era moderna, nós somos pacientes, não podemos adquirir tecnologia, temos que viver trancafiados em manicômios, não ter voz ativa, não ter liberdade de expressão, no cárcere privado e viver à base de medicamentos. Ficar impregnado e não ter liberdade para termos autonomia e seguir em frente nosso caminho”, afirmou.
A coordenadora geral do Conselho Regional de Psicologia, Adélia Capristano, está na luta antimanicomial há quase 20 anos e defende que cuidar tem que ser em liberdade. “Estou muito feliz aqui hoje, finalmente, ter um ato na frente do São Vicente de Paulo. O fato de estar aqui hoje é uma celebração. Está super precarizado o serviço do CAPS. Falta profissional, falta estrutura, falta material de consumo, falta acolhimento integral. Agora a gente tem que lidar com o que a gente tem, porque isso não pode ser uma justificativa para não fechar o Hospital Psiquiátrico", disse.
Amanda Medeiros, estudante, professora, militante e que tem diagnóstico, ressalta a importância das pessoas participarem politicamente e serem ativos na militância para conquistar a cidadania e manter seus direitos.
“Quando você preza pela democracia, você luta pelo direito do cuidado e liberdade, que é importante para o mundo. Principalmente o SUS, porque nesses espaços manicomiais e no sistema privado ainda se mantém também práticas manicomiais, violação contra mulheres, contra negros, contra pobres, são as pessoas que mais precisam e os trabalhadores no geral. A gente vê os casos de burnout, depressão, muito comum na classe trabalhadora então é muito importante relembrar esse dia a participação popular dos usuários da universidade, dos militantes, dos profissionais e dos trabalhadores da saúde mental. Ontem houve um ato no Buriti, foi muito importante a participação dos trabalhadores da saúde mental pedindo mais verbas enquanto o Ibaneis está comprando um helicóptero, que é o valor para se manter nove Caps", apontou a professora.
Programação Unificada do Maio Antimanicomial do DF
23/05 - Sessão Solene de Homenagem à Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) às 19h na Câmara Legislativa do DF
28/05 - Seminário Saúde Mental e Desinstitucionalização às 9h na Câmara Legislativa do DF
Edição: Márcia Silva