O Governo do Distrito Federal anunciou que, a partir de 1º de julho, os ônibus do transporte público não aceitarão mais o dinheiro em nota ou moeda como forma de pagamento da passagem. Ou seja, os carros coletivos passam a receber tarifa somente via pix, cartão bancário, cartão mobilidade ou cartão vale-transporte. A medida foi anunciada pela Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) do GDF no dia 16 de maio.
A retórica do governo alega que, dessa forma, visa aumentar a segurança dos passageiros, reduzir o tempo de embarque e combater a sonegação.
"Estamos implantando um sistema moderno e seguro, retirando a circulação de dinheiro dos ônibus e oferecendo diversas opções para o pagamento das passagens por meio eletrônico", explicou o secretário de Transporte e Mobilidade, Zeno Gonçalves.
No Distrito Federal, usuários que pagam suas viagens em dinheiro não podem aproveitar os benefícios da integração tarifária, disponível apenas para os que utilizam os cartões Mobilidade e Vale-transporte. Com a integração, é possível realizar até três embarques no mesmo sentido (ida ou volta) em um período de até três horas, pagando uma única tarifa de R$ 5,50, em vez de três passagens separadas.
Repercussão negativa
Usuários do transporte público se manifestaram nas redes sociais questionando principalmente o fator da exclusão digital e o risco de cobradores perderem seus empregos. Alguns apontam inclusive ao fato de que o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 39, inciso IX, considera como prática abusiva e proíbe expressamente a conduta do fornecedor que se recusa a vender bens ou prestar serviços ao consumidor que se disponha a adquiri-lo mediante pronto pagamento.
Presidente da Comissão de Transporte e Mobilidade Urbana (CTMU) da Câmara Legislativa do DF (CLDF), o deputado Max Maciel (PSol) cobrou da Secretaria de Transporte e Mobilidade do DF (Semob-DF) a ampliação da rede de pontos de venda e recarga de cartões de acesso a ônibus e metrô, além da inclusão de benefícios para os usuários. Ele argumenta que a medida de acabar com o pagamento em dinheiro nos ônibus pode dificultar o acesso ao transporte público para diversos grupos da população, como idosos, pessoas com deficiência e moradores de áreas com baixa cobertura bancária.
“A Secretaria de Mobilidade precisa ter cautela quando falamos de mudanças drásticas no sistema, ainda mais no que diz respeito ao sistema de bilhetagem pois nesses casos existem padrões de comportamentos culturais que não mudam de uma hora para outra, além disso cerca de 30% do valor arrecadado pelas empresas de ônibus é em dinheiro. Tomar essa decisão de maneira arbitrária, sem antes preparar os usuários do sistema de transporte e garantir mais postos de recarga com toda certeza vai onerar o Estado e prejudicar a população”, afirma Maciel.
Maciel acrescenta que é necessário “modernizar ainda, mas não basta dizer que vai retirar o dinheiro da tarifa dos ônibus se não garantir que a pessoa que tenha somente dinheiro consiga adquirir ou até recarregar o seu cartão por outros caminhos, como terminais, serviços em outras áreas como farmácias, padarias e totens espalhados na cidade”.
“Afinal, nós sabemos que nem todas as pessoas do DF têm acesso à internet ou são familiarizados com as tecnologias necessárias para utilizar os outros métodos de pagamento. Além de pedirmos explicações, fizemos uma indicação sugerindo à SEMOB a disponibilização massiva de pontos de recarga e emissão do cartão mobilidade, para assim, garantir mais qualidade no acesso ao sistema de transporte público!”, conclui o parlamentar distrital.
Representação
O Centro Brasiliense de Defesa dos Direitos Humanos (CentroDH) protocolou uma representação junto aos ministérios públicos de Contas (MPC-DF) e do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) para impedir a mudança tarifária.
Michel Platini, coordenador da entidade sem fins lucrativos, explica que apesar de aparentemente parecer uma modernização no sistema de transporte, a medida coloca em risco as pessoas que não têm acesso para esses meios de pagamento digital. "E os mais de 5 mil cobradores que devem ser colocados na rua, ficarão desempregados e não terão meios de sustentar suas famílias. Não somos contra que o GDF implemente medidas de modernização do pagamento na bilhetagem dos ônibus. O pagamento de formas digitais pode facilitar muito a vida das pessoas, mas esta não pode ser a única forma de cobrança e a única forma de acessar o transporte público”.
De acordo com a organização, dados indicam que cerca de 28 milhões de brasileiros ainda não usam o Pix, e aproximadamente 36 milhões de pessoas não acessaram a internet no Brasil em 2022. "Portanto, a obrigatoriedade de utilizar apenas meios digitais para o pagamento da passagem de ônibus exclui uma parcela considerável da população, violando seus direitos humanos, em especial à mobilidade, e afrontando o princípio da igualdade”.
Na avaliação do CentroDH, a atidude do GDF configura uma forma de violação direta dos direitos humanos. “A mudança para um sistema exclusivamente digital de pagamento exclui automaticamente aqueles que não têm acesso a smartphones, aplicativos bancários ou cartões de crédito e débito. Isso inclui especialmente os segmentos mais vulneráveis da sociedade, como idosos, pessoas de baixa renda e aqueles que vivem em áreas sem acesso à internet ou com pouca infraestrutura tecnológica. Ao impor uma forma de pagamento que depende de tecnologia digital, o governo está aprofundando as disparidades sociais e econômicas existentes. Aqueles que já enfrentam dificuldades financeiras ou sociais serão ainda mais prejudicados pela falta de acesso a serviços de transporte básicos, essenciais para o seu dia a dia”, afirma o texto da representação protocolada.
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Edição: Márcia Silva