Organizações que compõem a Frente DF pela Legalização do Aborto realizaram, nesta terça-feira (11), ato simbólico com a entrega de uma coroa de flores na residência oficial da Câmara dos Deputados, durante a reunião do Colégio de Líderes. O arranjo entregue estampava um pedido: “deputados, estamos em luto pelas crianças brasileiras estupradas, que perdem sua infância por falta de acesso ao aborto legal. Não ao PL 1904/2024”.
O objetivo do ato é pressionar o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), a não prosseguir com a votação do regime de urgência do Projeto de Lei 1904/2024, chamado por movimentos feministas de “PL da Gravidez Infantil”. Caso a urgência seja aprovada, o projeto seguirá direto para votação no Plenário da Câmara, sem antes passar por análise mais aprofundada das comissões.
“É um ato simbólico para denunciar essa tentativa de criminalização do direito ao aborto legal no Brasil’, defendeu Joluzia Batista, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).
A proposta apresentada pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) quer alterar o Código Penal, equiparando o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, com pena máxima de 20 anos tanto para as pessoas gestantes, quanto para os profissionais de saúde que as auxiliarem.
Para a assistente social e ex-conselheira tutelar Keka Bagno, o projeto é “bárbaro”. “É uma criminalização contra a vida das meninas e mulheres e a gente está aqui para dizer não!”, afirmou.
Aborto legal em risco, crianças desamparadas
Na prática, o PL 1904/2024 põe em risco o direito ao aborto legal no país. No Brasil, a interrupção da gestação é permitida em caso de estupro, de risco de vida ou de anencefalia fetal, independentemente da idade gestacional.
Toda relação sexual com crianças menores de 14 anos é considerada estupro pelo legislação penal, ao Estado cabe garantir o acesso ao aborto seguro para essas vítimas. Por isso, as organizações feministas alertam que o “PL da Gravidez Infantil” afeta principalmente as crianças vítimas de abuso sexual, que comumente chegam aos serviços de saúde com gravidez mais avançada.
“Gravidez infantil é coberta pelo medo, pelo sigilo, pela culpa e pela não informação. Muitas vezes as meninas nem sabem que estão grávidas”, afirmou Joluzia Batista durante o ato.
A representante do Cfemea relembrou que a bancada conservadora que agora tenta aprovar a criminalização do aborto após 22 semanas de gestação, mesmo entre crianças, é a mesma que barra o debate da educação sexual nas escolas.
“Professores e educadores são perseguidos por realizar um debate profundamente assertivo, que a gente precisa desenvolver na sociedade, de modo preventivo para evitar inclusive gravidez infantil”, afirmou.
Em 2022, foi registrado o maior número de estupros e estupros de vulnerável da história, com 74.930 vítimas, de acordo com o 17º Anuário de Segurança Pública. Seis em cada dez vítimas são crianças com idade entre 0 e 13 anos.
“Parece uma questão tão simples a gente dizer que as meninas não podem ser mães e que estuprador não é pai, ainda assim a gente vê projeto atrás de projeto como o que vai hoje pra pauta do Congresso Nacional”, lamentou a secretária de Mulheres da Central Única dos Trabalhadores (CUT-DF), Thaísa Magalhães.
Em maio deste ano, o Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) da Organização das Nações Unidas (ONU) cobrou do Brasil a garantia ao aborto legal, após mais de 12,5 mil meninas entre 8 e 14 anos serem mães em 2023 no país, segundo dados do governo federal.
“No Brasil, a realidade das mulheres desde o dia em que nascem é de violência. E as meninas que são estupradas no Brasil, por causa de toda desinformação espalhada no país, não têm acesso ao direito de conseguir a terminação da sua gravidez por estupro. É um desserviço o que a bancada conservadora na Câmara faz para a vida das mulheres”, completou Thaísa.
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Edição: Márcia Silva