Os 30 anos do genocídio dos grupos étnicos tútsis e tuás em Ruanda, foram lembrados nesta quarta-feira, em uma sessão solene na Câmara Legislativa do Distrito Federal, organizada pela embaixada do país.
Com o tema “Kwibuka 30: Lembrar-Unir-Renovar”, a cerimônia resgatou a memória do massacre que aconteceu entre os meses de abril e julho de 1994 e matou mais de um milhão de pessoas. No idioma oficial dos ruandeses, Kinyarwanda, “Kwibuka 30” significa “lembrar 30” e simboliza a importância de manter viva a memória das vítimas.
O embaixador de Ruanda no Brasil, Lawrence Manzi, afirmou que o genocídio trouxe uma série de consequências devastadoras, incluindo traumas profundos, doenças, questões judiciais, superlotação nas prisões e um impacto significativo na economia. Além disso, ele destacou que agora existe também o desafio de combater o negacionismo do genocídio, que ameaça comprometer o processo de recuperação da população ruandesa.
“Devemos promover a educação sobre o assunto, especialmente para a geração mais jovem. Ainda temos atrasos no estabelecimento pleno da justiça, com muitos fugitivos do genocídio escondidos ou protegidos nas capitais ocidentais".
De acordo com a Embaixada, a intenção de Kwibuka 30 é aumentar de maneira sólida a consciência da comunidade internacional sobre o significado da vida e da humanidade. “Além de servir como um lembrete do compromisso comum de preservar e proteger os direitos humanos fundamentais”.
:: O imperialismo como de costume ::
O massacre contra os grupos tútsis e twa, durou pouco mais de 100 dias e ocorreu no contexto de guerra civil no país. A escala e a brutalidade do massacre chocaram o mundo inteiro, mas nações ocidentais como Bélgica, França, Estados Unidos, entre outras, ignoraram os acontecimentos. A maioria das vítimas foi morta em suas próprias aldeias ou cidades.
“Eu tinha apenas 6 anos, foi quando vi, pela primeira vez, uma pessoa morta. Cheguei a escutar tardes inteiras de tiros. Os assassinos matavam durante o dia e descansavam à noite. Lembro até hoje do cheiro de sangue que tinha nas escolas, na minha casa. Eu vi minha tia no chão sendo cortada em pedaços com machetes. Chorávamos e pedíamos perdão. O sangue corria por toda parte”, disse o engenheiro ruandês Christian Niyoyita, sobrevivente do genocídio, durante a sessão solene na CLDF. No massacre ele perdeu também o pai e a irmã e lembrou que as pessoas suplicavam para serem mortas com tiros, pois todos eram cortados por facões.
Com participação na CLDF por vídeo, Veneranda Ingabire, diretora Executiva de Memória e Prevenção do Genocídio do Ministério da Unidade Nacional e Engajamento Cívico do governo de Ruanda, explicou que massacre ocorrido em 1994 é na verdade o ápice de um longo processo de décadas conflitos promovidos por políticos de apoio colonial, que iniciou na década de 50.
Segundo Veneranda, o ódio contra os tútsis foi transformado em política de Estado. “Desde 1959 a ideologia do genocídio foi construída e criou raízes na consciência de Ruanda. O ódio e divisão étnica foi ensinado nas escolas e a impunidade foi estabelecida em todas as comunidades”, disse a diretora.
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Em 1973, Juvénal Habyarimana assumiu o comando do país, via golpe militar, por 20 anos. Nesse período, o presidente incentivou a rivalidade entre os grupos étnicos que formavam o país, hutus, tutsis e twa, favorecendo seu próprio grupo, os hutus.
“Sob seu governo, uma política de discriminação foi estabelecida proporcionando bairros de base étnica em todos os setores do país, incluindo a economia Isto era a forma em que eles discriminavam sistematicamente os tútsi e, eventualmente, os forçavam ao exílio, pobreza ou ser mortos e exterminados”, afirmou a representante do governo de Ruanda.
Outras entidades também participaram do evento, como o diretor do Departamento de África no Ministério das Relações Exteriores, embaixador Antonio Augusto Martins Cesar, e o embaixador da República de Camarões do Brasil, Martin Agbor Mbeng.
Exposição
Além da solenidade, a CLDF também recebe a exposição “Peace is our choice: A paz é nossa escolha”, aberta para visitação até 14 de junho. O objetivo, de acordo com a Embaixada, é transmitir dados históricos, relatos de vítimas e de personagens importantes, além de destacar as histórias de superação e resiliência do povo ruandês.
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Edição: Flávia Quirino