Distrito Federal

Coluna

Família Hip Hop 25 anos: celebração do coletivo que traduz Santa Maria e atravessa as periferias do Distrito Federal

Imagem de perfil do Colunistaesd
Empoderados pela cultura Hip Hop e com a autoestima fortalecida, um grupo de quatro jovens de Santa Maria criou o Família Hip Hop - Foto: Divulgação/Família Hip Hop
Santa Maria era uma cidade satélite recém-criada em um contexto político contraditório de loteamento

Em 1999, nascia o Coletivo Família Hip Hop. Naquele ano, Santa Maria era uma cidade satélite (como chamávamos então) recém-criada em um contexto político contraditório, no qual um programa de loteamento para famílias pobres visava garantir o direito à moradia numa estratégia descolada da garantia de todos os demais direitos sociais e de cidadania. Faltavam escolas, asfalto, saneamento e centros de saúde.

A área semi-urbanizada não oferecia muitos recursos, e as primeiras famílias enfrentaram diversos desafios e dificuldades. Contudo, foram ativas na construção não só de suas casas, mas, sobretudo, de sua identidade, de sua cultura, de sua cidade. A juventude, obviamente, teve papel fundamental nesse sentido. Quando os problemas sociais e econômicos, que pesavam fortemente sobre as populações periféricas (e de forma contundente sobre a Região Administrativa, que contava com apenas seis anos de existência), se acirravam, o Movimento Hip Hop trouxe um novo patamar de esperança.

Embalados ao som do melhor do Rap nacional e internacional dos anos 1990, os jovens pretos da classe trabalhadora e das periferias afora, puderam ver seus dramas, sonhos e ambições retratados de forma crítica, forte e subversiva. Muitos se inspiravam não só nas letras de grandes Rappers e grupos, como Consciência Humana, Facção Central e Racionais, ou Álibi, Cirurgia Moral e Código Penal, mas também nas ideologias subjacentes que se expressavam no grafite e no pixo, nas construções sonoras dos DJs e nas batalhas de breaking. O visual e a postura, a consciência social e política, o questionamento de tudo aquilo que lhes tocava: a violência, a discriminação, a ausência de políticas, a fome, o desemprego, o silenciamento e a censura.

Um olhar para a periferia: Santa Maria, 29 anos

Empoderados pela cultura Hip Hop e com a autoestima fortalecida, um grupo de quatro jovens de Santa Maria - todos provenientes de outras localidades e deslocados na infância junto com suas famílias - em atitude de afirmação dessa cultura para si e para o seu lugar, como um modo de ser e existir num mundo que lhes negava direitos, dignidade e possibilidades, e lhes julgava pela cor da pele, pelas roupas e estilo, pelo modo de falar e se expressar, criou o que eles chamaram de FAMÍLIA HIP HOP. Eles queriam poder criar e expressar sua arte e viver dignamente de seus talentos, além de passar a mensagem do Hip Hop militante, elemento presente desde o começo, embora tenha amadurecido e se transformado ao longo de 25 anos de história. Eles queriam poder falar e, obviamente, se divertir. E, neste ato, fizeram mais: firmaram uma identidade para a cidade e deram a Santa Maria a cara do Hip Hop.

Entre o sonho de cantar e o compromisso assumido com a transformação social, os jovens cresceram, o coletivo cresceu – em grandeza e participantes – e sua atuação na cidade e no Distrito Federal se diversificou. O grupo se formalizou juridicamente e ganhou o nome de Núcleo de Formação Popular Família Hip Hop. Assim, para além da produção de shows e eventos de Hip Hop, a Família desenvolveu e desenvolve projetos, ações e intervenções, autonomamente e em parceria com movimentos sociais, de educação popular, geração de renda, garantia de direitos humanos, articulação de redes, mobilização popular e controle democrático. Já proporcionou espaços de debate importantes, como o Sarau Prosas Latinas, o Cine Diversos Olhares e a Escola de Formação do Hip Hop. Em parceria com outros atores da cena cultural de periferia, pôde protagonizar eventos emblemáticos, como o Prêmio Hip Hop Zumbi, que teve quatro edições e reconheceu e divulgou a cultura do Movimento Hip Hop no DF.

Talvez um dos momentos mais relevantes da história do Coletivo seja a ocupação do local que hoje é a sua sede, o Espaço Cultural Moinho de Vento. Ocupação representa a tomada da cidade, do espaço público e das ruas pelo povo, num movimento de plena cidadania ativa. O direito à cidade é, talvez, um dos direitos humanos mais negligenciados e cabe aos movimentos organizados, principalmente das juventudes pretas, periféricas e da classe trabalhadora, a condução desse debate, algo feito de forma exemplar pela Família Hip Hop. O Moinho de Vento é símbolo de várias lutas e acolhe todas as pessoas que buscam organização popular, conhecimento crítico, cultura hip hop e militância consciente. É ponto de cultura da Santa Maria e local onde acontecem grande número das atividades e produções da Família.

No mês de junho, esta história completa 25 anos. Deixamos nosso convite para conhecer, se inspirar e se juntar aos nossos sonhos.

:: Leia outros textos da Família Hip Hop aqui ::

*Alex Martins Silva e Paula Juliana Foltran são membros do Coletivo Família Hip Hop.

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha do editorial do jornal Brasil de Fato - DF.

:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::

Edição: Rafaela Ferreira