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Novo Ensino Médio: a reforma da reforma 

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Aprovado no dia 9 de julho pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 5.230/23 desconsiderou as mudanças propostas pelo Senado Federal - Foto: Mario Agra/Câmara dos Deputados
É preciso fortalecer políticas públicas que diminuam, e não aumentem, as desigualdades no ensino

A Reforma do Ensino Médio, aprovada em 2017, ganhou agora, em 2024, um novo texto. Aprovado no dia 9 de julho pela Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 5.230/23 desconsiderou as mudanças propostas pelo Senado Federal, como o trecho que obrigava o ensino médio a ter no mínimo 70% da grade como disciplina básica e apenas 30% para os itinerários formativos, além da obrigatoriedade do ensino de espanhol. Estas propostas, que foram retiradas pela Câmara, no entendimento dos senadores, eram fundamentais para  minimizar o impacto negativo da Reforma na vida dos estudantes das escolas públicas. 

O texto desta nova reforma, agora aprovado em definitivo na Câmara dos Deputados, segue para sanção presidencial e alerta que é preciso fortalecer políticas públicas que diminuam, e não aumentem, as desigualdades no ensino. A proposta aprovada amplia esta desigualdade, mais do que permite criar instrumentos para enfrentá-la.

Um exemplo disso é a regulamentação das contratações por notório saber para atuação na Educação Técnica e Profissional por meio de diretrizes nacionais. As escolas precisam de professoras e professores com formação, capacitação, além de valorização profissional. E isso não se faz apenas com notório saber - titulação prevista na legislação que permite formalizar um título que habilite profissionais com relevante experiência extra-acadêmica para a docência reconhecendo esse conhecimento adquirido fora do ensino superior formal como "notório".

A realidade das escolas públicas é a de um alto percentual de docentes que atuam ainda sem a formação e a qualificação necessárias. A elevada rotatividade por conta dos concursos temporários também não colabora para que haja efetiva capacitação para a docência. 

Alguns outros pontos aprovados pela Câmara dos Deputados também têm apresentado preocupações na comunidade acadêmica e em entidades que têm lutado pela educação do país. Entre eles estão a não obrigatoriedade da oferta da disciplina de língua espanhola, a manutenção da carga horária de formação básica em 1.800 horas nos cursos técnicos – podendo chegar a 2.100 horas se houver convergência de conteúdos entre o itinerário, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – e a autorização de EaD no Ensino Médio. Esses são alguns dos itens aprovados no Projeto de Lei discutido na Câmara dos Deputados que sofrem fortes críticas pelas entidades sindicais e estudantis.

Vulnerabilidade no acesso ao ensino

Ademais, a maneira como está organizada a nova reforma do ensino médio não abrange estudantes que precisam aliar estudos e trabalho. Os alunos do ensino técnico, por exemplo, deveriam ter pelo menos 2.400 horas de formação geral básica. Estudantes que buscam o técnico são mais vulneráveis e ficam em desvantagem no acesso ao ensino superior.

A reforma manteve ainda a possibilidade de que cursos de curta duração possam compor os itinerários dos cursos técnicos. Essas formações podem ter de 20 a 40 horas, o que não garante de fato uma habilitação profissional e pode demonstrar que a expansão da escolarização não garante a qualidade da educação, a inclusão ou a permanência dos estudantes na escola. Este problema havia sido resolvido pelo Senado, mas foi rejeitado pela Câmara, quando determinou que apenas as formações disponíveis no Catálogo Nacional de Cursos Técnicos pudessem ser oferecidas. Esses são cursos de pelo menos 900 horas. 

Assim, da forma como está apresentado, o PL contribui para os jovens da classe trabalhadora sejam induzidos a cursarem itinerários de qualificação profissional de baixa complexidade e ofertados precariamente, já que muitas escolas não têm infraestrutura adequada.

Os pontos apresentados demonstram que a aprovação do PL, da forma que foi feita, e as reformulações realizadas aprofundam as desigualdades sociais e aumentam o investimento no setor privado da educação, já que apenas estes poderão efetivamente atender os requisitos necessários para a formação, mesmo que com qualidade rebaixada.

As mudanças devem entrar em vigor até 2025, conforme aprovado. O esforço para que o ensino médio acolha a todos os estudantes e garanta o acesso ao acesso à educação superior não acabou. Convidamos a todos que lutam por uma educação pública, gratuita e de qualidade a continuarem a articulação para que outras reformas possam vir a garantir um texto que faça a inclusão, e não aumentar a exclusão, dos estudantes das escolas públicas do país. A ADUnB-S.Sind faz parte da luta em defesa da educação de qualidade para a juventude brasileira, especialmente para os jovens da classe trabalhadora cujo direito à educação vem sendo historicamente sonegado.

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*Diretoria da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (ADUnB - S. Sind. do ANDES-SN)

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

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Edição: Rafaela Ferreira