Na noite desta quinta-feira (1), a vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP), publicou o trecho de um vídeo da luta de boxe entre Imane Khelif, da Argélia, e a italiana Angela Carini no Jogos Olímpicos de Paris 2024. Na legenda, a vice-governadora promove uma enquete: "Deixe aqui sua opinião! Essa luta foi justa?" e questiona "Vocês acham justa uma luta entre uma mulher trans, que, apesar de se identificar como mulher, pode levar vantagem física?"
Apesar da publicação da vice-governadora, Imane Khelif não é uma mulher trans. O Comitê Olímpico Internacional (COI) autorizou a participação de Khelif nas Olímpiadas. A entidade frisou que todos os participantes dos torneios de boxe dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 "cumprem os requisitos de participação e elegibilidade da competição, bem como todas as regulamentações médicas aplicáveis".
Na publicação, Celina escreve que reafirma que é contra qualquer forma de preconceito, que é preciso respeitar as orientações sexuais, escolhas religiosas, raças, cedo e posicionamentos políticos. Porém, na legenda, a vice-governadora escreve que "quando se trata de esportes, como atleta, entendo que, fisiologicamente, a força masculina leva vantagem. Mesmo que tenhamos habilidades e destreza, a força física masculina tende a superar, especialmente, em esportes de contato físico."
Com mais de 136 mil seguidores na rede social, minutos depois, centenas de comentários com preconceito e também alertas de que se tratava de uma informação falsa. Após a repercussão de que propagou transfobia e fake news, Celina Leão apagou a postagem.
Após a publicação da matéria, a assessoria de imprensa da vice-governadora entrou em contato com a Redação e enviou uma nota em que negam que Celina Leão tenha afirmado que Khelif é uma mulher trans. "Ela levantou uma questão nas redes sociais sobre as vantagens físicas que atletas trans podem ter ao competir contra atletas mulheres cisgênero. Quando surgiu a informação de que a atleta não era trans, ela determinou a exclusão da publicação", diz trecho da resposta.
A nota também justifica que "esse ato de corrigir a informação, assim como fazem os veículos de comunicação durante um processo de checagem e recuo, é um procedimento respeitoso e absolutamente natural". No entanto, apesar da informação falsa de que a luta era entre uma mulher trans x mulher cis e do debate provocado, a vice-governadora não corrigiu a desinformação veiculada.
Para Lucci Laporta, colunista do Brasil de Fato DF, assistente social, militante transfeminista e dirigente do coletivo Juntas, não cabe à "gente leiga" se manifestar sobre o assunto e "muito menos a vice-governadora abrir espaço para achismos". "Que bom que repensou na própria irresponsabilidade - e na fake news que divulgou, uma vez que a atleta não é uma mulher trans e nem tem o sexo masculino (sexo não se define apenas por cromossomos)."
"A gente precisa superar a ideia de que qualquer um pode opinar sobre qualquer assunto e que transfobia ou preconceito contra pessoas intersexo seja questão de 'opinião' ou simples divergência política. Os direitos humanos são um princípio, uma das bases para a democracia. Relativizá-los é um comportamento de quem não entende ou não se compromete com a democracia", afirma a especialista.
Entenda o caso
A vitória da boxeadora argelina Imane Khelif desencadeou uma polêmica sobre gênero nesta quinta-feira (1). A participação de Khelif nos Jogos de Paris também gerou questionamentos por causa da desqualificação dela no Campeonato Mundial de Boxe Feminino, em Nova Delhi, em março de 2023.
Naquela época, a atleta foi excluída por causa de um teste de DNA, quando já havia chegado à final. A Associação Internacional de Boxe (IBA), organizadora de competição, justificou a decisão afirmando que a argelina violava a regra que barrava dos torneios femininos pessoas com cromossomos XY.
Normalmente, mulheres têm dois cromossomos X, enquanto homens têm um X e um Y. Há, porém, casos raros de mulheres com características biológicas femininas que, mesmo assim, apresentam um cromossomo Y.
O porta voz do COI, Mark Adams defendeu a presença de Khelif e da taiwanesa Lin Yu-Ting nos Jogos. "Estamos falando sobre a vida de pessoas", afirmou. "Elas participam de competições femininas, elas ganharam e perderam de mulheres ao longo de anos".
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Edição: Flávia Quirino