A organização popular no município, fez ferver as contradições do latifúndio atrasado.
As vozes de muitas mãos, espero que ecoem nesse Muro de diálogos da caminhada.
Não podemos começar a caminhada sem lembrar das reflexões sobre essa terra, trazidas por uma de suas maiores intelectuais, Lélia Gonzalez (1935-1994).
Nessas terras afrolatinas, não somos uma transposição do continente mãe, devemos entender que a cultura afro-americana será diferente da cultura africana, mesmo existindo declaradas conexões entre elas em todas as dimensões. Essa ação de mútua influência entre as culturas negra, indígena e europeia foi o que produziu a base das maiores contradições desta nação, que se refletem aqui, no Distrito Federal.
Na Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (Ride-DF), diversas lutas sociais merecem destaque nessa ideia que espero que troquemos. Da luta pela terra e a Reforma Agrária Popular (RAP), lutas do povo preto para ocupar todos os espaços e outras lutas. Este texto pretende passar o olho sobre eventos que estão transformando a capital federal e seus arredores.
A luta pela terra capitaneada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do DF, na Ride-DF ou para os mais íntimos o famoso “Entorno” tem se intensificado na região de Minas Gerais. O município de Buritis, no noroeste do estado, reuniu mais de 250 famílias para dialogar sobre a luta pela terra, uma possibilidade de acesso à terra a toda uma população rural despossuída.
A maioria das vezes, elas tiveram que migrar da região para trabalhar em propriedades do agronegócio nas mais diversas condições ou nas regiões centrais e vislumbram a chance de retornar a “casa” através das possibilidades do Decreto nº 433, de 24 de janeiro de 1992.
A “D433”, como é reconhecida, é o decreto que “dispõe sobre a aquisição de imóveis rurais, para fins de reforma agrária, por meio de compra e venda”. Grandes proprietários da região têm feito propostas ao governo federal, que está aberto a negociações, agitando a região, cultivando o direito à terra que há tempos estava adormecido.
Não poderia me furtar de registrar que a organização popular no município, fez ferver as contradições do latifúndio atrasado. Nas reuniões com a população, informantes de grandes proprietários e de diversos partidos conservadores com pautas contrárias à reforma agrária popular estão presentes, mas isso não inibiu o povo.
As reuniões que seguem em meio ao avanço do processo de acesso à terra, apenas evidenciam as dimensões da realidade da luta pelo direito em um país de latifúndios.
Armazém do Campo
Por outro lado, no começo do mês de julho o MST do DF e Entorno, inaugurou a nova loja do Armazém do Campo, com produtos da terra e um espaço muito importante de diálogo e organização da classe trabalhadora. Uma festa linda, com várias atrações, alimentação saudável e presença de diversas personalidades da luta que passaram por lá.
No entanto, alguns relatos e as fotos expressaram, mesmo em um espaço progressistas, pessoas negras incomodadas e houve um retorno que aqui trago ipsis litteris “lutemos, para que não seja aqui em Brasília um armazém dos brancos”. O público era apenas um. Uma realidade a ser vencida pelas organizações populares, a periferia e o campo para que também ocupem o centros ou cultivaremos mais do mesmo.
Por fim, que ele siga seus princípios e possa comercializar os mais diversos produtos produzidos na região que por vezes são invisibilizados pelo agronegócio e suas mercadorias - que não são alimentos e as famílias muitas vezes os consomem, por conveniência ou por ignorância dos produtos agroecológicos.
E por aqui, espero acompanhar a ida desse povo para a terra e as outras etapas desse processo.
*Rafael Bastos é pai de Iracema e Omar, cientista social e militante do MST do Distrito Federal e Entorno.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
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Edição: Flávia Quirino