A doutora em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília (UnB), Mônica Tenaglia, foi uma das ganhadoras da 1ª edição do Prêmio Jabuti Acadêmico de 2024. O livro "As comissões da verdade e os arquivos da ditadura militar brasileira", publicado pela Editora Universidade de Brasília, foi o vencedor na categoria "História e Arqueologia" no eixo "Ciência e Cultura".
Com o objetivo de premiar produções dedicadas às áreas científicas, técnicas e profissionais, a premiação celebra obras que contribuem significativamente para esses campos. O evento, realizado no dia 6 de agosto, foi promovido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL). Além de Mônica, a cerimônia consagrou vencedores em mais 28 categorias.
Ao Brasil de Fato DF, a também professora adjunta no curso de Arquivologia e no Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Pará (UFPA) relatou que ter seu livro disputando a premiação foi uma surpresa, já que não sabia — ou não lembrava — que a Editora UnB havia submetido a obra ao Prêmio.
"Foi uma surpresa bastante emocionante, especialmente quando o livro foi indicado à final. [...] De toda forma, acredito que a maior contribuição desse prêmio foi dar visibilidade não apenas ao meu livro, mas também à temática da ditadura militar, às comissões da verdade, e à importância dos arquivos para se compreender esse período", afirma a pesquisadora.
A obra foi lançada em 2024 e surgiu a partir de sua tese de doutorado. A pesquisadora conta que, como já havia trabalhado como arquivista na Comissão Nacional da Verdade (CNV), em Brasília, e já havia feito um mestrado em Ciência da Informação sobre o acesso à informação, ela queria entender, cientificamente, como as comissões da verdade brasileiras se relacionaram com os arquivos da ditadura militar.
Comissões da verdade
O livro de Mônica Tenaglia explora o contexto histórico-legal das comissões da verdade no Brasil e no mundo, além de reconstruir as estratégias e ações das comissões brasileiras para o acesso aos arquivos da ditadura militar (1964-1985). A obra discute o fenômeno da criação de comissões da verdade em todo o território nacional brasileiro e as relações dessas comissões com os arquivos.
A professora explica que as comissões da verdade são órgãos temporários, criados de modo oficial para investigar crimes e violações de direitos humanos ocorridos durante um período específico. Ela esclarece que esses mecanismos buscam clarificar as circunstâncias dessas violações e registrá-las em um relatório final, que pode ser utilizado, por exemplo, pela justiça para punir os perpetradores.
Questionada sobre o processo de realização da pesquisa, Mônica menciona que também quis estabelecer se a Lei de Acesso à Informação (LAI) havia contribuído, de alguma forma, na relação das comissões com os arquivos da ditadura militar. Ela explica que a LAI, criada em 2011, ao mesmo tempo que a Comissão Nacional da Verdade, possui mecanismos que orientam sobre a não restrição de acesso às informações e documentos que versam sobre violações de direitos humanos (art. 21).
"Eu queria compreender se as comissões da verdade tiveram dificuldades, quais foram elas, o que fizeram para superá-las, quais documentos utilizaram em suas investigações e onde estavam os acervos que elas mesmas produziram no âmbito de suas investigações — porque, na minha perspectiva, os documentos são essenciais à defesa dos direitos humanos e às investigações sobre violações de direitos humanos", pontua a pesquisadora.
Ações educativas sobre a ditadura militar
O livro de Mônica também evidencia a insuficiência das políticas de gestão documental e um quadro de negação, ocultamento e destruição dos arquivos do período da ditadura militar. A pesquisa também aponta que, como lacuna na atuação das comissões de verdade no Brasil, foram poucas as ações educativas realizadas fora dos círculos acadêmicos e voltados a uma parcela mais ampla da população brasileira.
A professora conta que apenas uma comissão da verdade estadual - a Comissão do Amapá - desenvolveu atividades educacionais. "Essa recomendação vem de diretrizes internacionais que apontam para essa necessidade à eficácia dos trabalhos das comissões", explica.
Ela aponta também que, apesar deste fato, depois de alguns anos do final da pesquisa e escrita do livro, as comissões da verdade analisadas não teriam condições de desenvolver atividades para além da coleta de depoimentos ou de pesquisa/investigação, especialmente as que trabalharam com poucos recursos, contando apenas com a colaboração de voluntários. "A maioria das 88 comissões da verdade que identifiquei (2/3 delas) sequer entregaram um relatório final", diz Monica.
"Realmente acredito que há bastante a ser feito em relação às atividades educativas sobre o período ditatorial militar. Além do ensino, em qualquer que seja o nível escolar, penso que é importante a realização de atividades que fomentem o debate e a reflexão sobre o período e as formas como ele se apresenta no nosso presente e nos relacionamos com ele", afirma.
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Edição: Flávia Quirino