O Distrito Federal tem, atualmente, 56 Áreas de Regularização de Interesse Social (ARIS), locais regulamentados por meio do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) de 2009 como territórios destinados à regularização fundiária. Essas áreas se caracterizam por possuírem habitações irregulares e/ou ocupações informais. Em muitas delas, há flagrantes violações de direitos humanos e socioambientais.
Para levar as demandas da população que vive nesses locais ao poder legislativo, foi lançada, na última sexta-feira (23), a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos e Socioambientais das ARIS. Presidida pelo deputado distrital Fábio Felix (Psol), a Frente foi resultado de uma articulação realizada por diferentes movimentos sociais e lideranças comunitárias, encabeçada pelo grupo Vida & Água para ARIS, um projeto de pesquisa e extensão da Universidade de Brasília (UnB).
“Há uma distância enorme entre aquilo que o governo e o poder público faz olhando para a realidade de uma elite, e aquilo que ele faz olhando para a realidade de quem está em situação de vulnerabilidade social ou nas Áreas de Regularização de Interesse Social”, avaliou Fábio Felix, em relação à demora para a chegada de infraestrutura e outros equipamentos públicos nas ARIS.
“Se esse governo construir, por exemplo, um condomínios de alto padrão na Serrinha do Paranoá, no Lago Oeste ou no novo setor habitacional do Lago Sul, em quanto tempo vocês acham que a Caesb [Companhia Ambiental de Saneamento do Distrito Federal] irá colocar água e saneamento básico nesses condomínios? Com certeza, será muito rápido. As populações da ARIS não são prioridade para esse governo. Eles só prometem alguma coisa, que com certeza não irão cumprir, durante o período eleitoral”, questionou, no mesmo sentido, Guilherme Jaganu, coordenador do Fórum de Defesa das Águas do DF.
Reivindicações
Perci Coelho de Souza, professor da UnB e coordenador do projeto Vida & Água para ARIS, cobrou que a Frente Parlamentar não seja apenas uma formalidade, mas que se transforme em um “compromisso com a justiça, um chamado para que não sejamos insensíveis às necessidades daqueles que vivem nas ARIS”.
O professor apresentou os primeiros quatro pontos de reivindicações para a Frente: instalação de um cronograma de audiências públicas a respeito das ARIS, criação de um comitê científico de apoio à Frente Parlamentar, requisição ao executivo de acesso ao Geoportal e realização de um seminário para a apresentação dos dados do Atlas das ARIS. “Essas reivindicações não são meros pedidos, são exigências de justiça, dignidade e direitos básicos que devem ser atendidos sem demora”, destacou Perci.
O Atlas com dados inéditos sobre o acesso à água e ao tratamento de esgoto nas ARIS estava previsto para ser lançado durante a audiência de instalação da Frente Parlamentar, no entanto, por questões editoriais, e grupo de pesquisadores responsáveis, em acordo com o mandato de Fábio Felix, decidiu adiar o lançamento.
Segundo dados preliminares aos quais o o Brasil de Fato DF teve acesso, as ARIS mais afetadas pelo desabastecimento de água potável são Sol Nascente, com 33.643 pessoas não atendidas pelo sistema da Caesb (52,6% da população total); Arapoanga I, com 33.425 pessoas não atendidas (94,3% da população total); e Mestre D’Armas I, que fica na região administrativa (RA) de Planaltina, com 27.221 pessoas sem atendimento (92,3% da população total).
O Atlas é estruturado em dois grandes blocos: mapas detalhados e análises críticas. Os mapas revelam a distribuição das ARIS ao longo de nove eixos territoriais no DF, com um foco especial na cobertura dos serviços de abastecimento de água e tratamento de esgoto. A análise crítica que acompanha os mapas denuncia as lacunas na infraestrutura, mostrando, por exemplo, como em muitos casos as adutoras de água passam tangencialmente às ARIS, sem garantir o acesso pleno ao
O documento será um importante instrumento de embasamento para a revisão do PDOT, atualmente em discussão na CLDF. É por meio desta lei que as poligonais das ARIS são identificadas, concedendo-lhes o direito à regularização fundiária e, assim, condições para acesso à obras e infraestrutura.
Participação popular
Lideranças comunitárias e representantes da população das ARIS também participaram do lançamento da Frente Parlamentar. Maristela Marques, moradora da ARIS Ribeirão, exigiu que o poder público escute as reivindicações da população.
“Estamos aqui lutando pelos objetivos dos nossos filhos e netos”, defendeu. “É justo ter especulação nas terras das ARIS? é justo nós que pagamos nossos impostos sermos, como se diz, jogado a Deus dará, sem ter um teto para morar?”, questionou Maristela.
“Hoje em dia o empresário tem mais direito do que nós que somos das ARIS. Então estamos aqui para pedir para que olhem para a gente, porque nós precisamos sim da moradia, da água, de educação, de segurança. Nós das ARIS também somos seres humanos, que lutam pelos seus objetivos. Nós não somos anônimos. Nós queremos ser ouvidas”, completou a moradora de Ribeirão.
Representante da Associação Mulheres das Águas de Sobradinho - DF, Maria Magnólia recomendou que a Frente Parlamentar em Defesa das ARIS junte esforços e trabalhe em conjunto com outras, como a recém criada Frente de Prevenção aos Extremos Climáticos.
“Essas duas frentes têm em comum o fato de que são as populações mais vulneráveis, as que mais sofrem os impactos dos extremos climáticos”, avaliou. “E nesse sentido, peço que dêem especial atenção às mulheres residentes nas ARIS, porque elas são maioria nesses territórios e são também as que mais são afetadas. Por exemplo, a crise hídrica prevista para o DF afetará a todos nós, mas ela é potencialmente mais devastadora para as donas de casa das AIRS, que mesmo em tempos normais, já sofrem com a falta de água em quantidade e qualidade em seus lares”, defendeu.
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Edição: Flávia Quirino