Após um ano inteiro de intensa mobilização, com atos, lives, interação e um período de quase 7 semanas de greve lutando pela reestruturação da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (CEMA) e do Plano Especial de Cargos do Ibama e do Ministério Meio Ambiente (PECMA), os servidores ambientais federais assinaram acordo com o Ministério de Gestão e Inovação (MGI) no dia 12 de agosto, em Brasília.
Chegamos ao fim deste período de luta com a certeza de que a visão que o governo tem da área ambiental não se alinha com o seu discurso de promoção propagado na grande mídia e em eventos internacionais. Durante o processo de negociações foi perceptível o desinteresse em dar a devida importância e espaço para a carreira ambiental dentro do Poder Executivo.
É preciso dizer, objetivamente, que o que aconteceu não foi uma negociação de fato. As propostas apresentadas neste processo, com denso diagnóstico e estudos produzidos pela categoria, não foram verdadeiramente levadas em consideração pelo MGI nas reuniões da Mesa Temporária de negociação.
Qual seria o motivo disso? Fizemos algumas leituras de contexto que nos apontaram para dois quadros.
O primeiro - seguindo em tom de autocrítica - diz respeito às expectativas geradas por toda a categoria em cima do governo atual. O então governo do PT se auto promoveu ao colocar a discussão do meio ambiente no centro de seu discurso na última campanha eleitoral presidencial, além de pôr em pauta a relevância do tema para a comunidade internacional firmando diversos compromissos pela sua defesa, monitoramento e preservação, sobretudo da Amazônia. O movimento de servidores da carreira ambiental e suas entidades compreenderam que este seria um momento crucial e uma janela de oportunidade que jamais tiveram nos governos anteriores. Assim, a construção discursiva e de ações das mobilizações orientou-se nesse sentido. A prática adotada pelo governo, contudo, mostrou-se bem diferente, e é neste sentido que entendemos o segundo quadro.
Processo de reestruturação das carreiras
O governo Lula não chegou a assumir a tão conhecida PEC 32, mas colocará em execução uma reforma administrativa que, ainda que não tenhamos a dimensão da totalidade de sua consequência, já está em curso dentro do processo de reestruturação de carreiras.
Desde o início, e tomando como base uma linha de organização pela modernização do Estado, houve o reordenamento de carreiras a partir de blocos por similaridade de competências e atribuições de diversos serviços públicos. Essa reorganização partiria de uma justificativa de mais eficiência e de simplicidade num quadro de inúmeras carreiras, objetivando uma diminuição histórica de vencimentos entre carreiras.
Entretanto, o que ocorreu foi a consolidação das diferenças e, no caso dos servidores ambientais federais, um nivelamento para baixo ao adicionar a carreira num conjunto de outras carreiras também, historicamente, desvalorizadas pelos nossos governantes. Vale ressaltar que a cerne de nossa reivindicação não é meramente salarial, nem muito menos visa estar no topo do serviço público, mas sim reduzir o fosso abissal - hoje sacramentado - entre as carreiras mais valorizadas do Executivo e a nossa.
É preciso pontuar que não somos e tampouco nos achamos melhores que as outras categorias. Na realidade, todos nós fazemos parte da classe trabalhadora em prol da manutenção de um serviço público de qualidade e igualitário. Por isso, acreditamos que a dinâmica de negociação separada adotada pelo MGI também se configura como operacional tático do governo federal para preparar o terreno para uma reforma administrativa. Mas, ainda assim e sobretudo, a categoria lutou bravamente com as servidoras e os servidores tendo a total noção da urgência da pauta ambiental e da sua relação com o modo de produção de vida e de sentidos no limiar do caos.
Se o governo o usou como barganha eleitoral, nós alertamos e denunciamos que o caos climático é realidade, que a gestão ambiental beira ao caos e que uma reestruturação de fato, contribuiria para uma mitigação dos problemas, que precisam ser considerados com mais seriedade e comprometimento, como plano de Estado. Jamais voltaremos para condições ambientais mais equilibradas. E para se tentar o equilíbrio no cenário de depreciação dos recursos ambientais, somente a presença fortalecida dos órgãos ambientais junto com outra lógica de produção de vida, trará um horizonte de planeta para as próximas gerações.
O governo vai tecendo as suas escolhas priorizando pautas fiscais e deixando o conjunto de políticas públicas e sociais minguarem. Isso terá consequências, não tenham dúvidas. Mas, as lutas não cessam e no cotidiano, ainda que o acordo esteja firmado sobre estes termos, os servidores ambientais seguirão tentando reverter retrocessos - junto ao Congresso Nacional e nas instâncias possíveis do judiciário.
Como desafio, a categoria tem que qualificar a formação política dos servidores e trabalhar com engajamento para que a classe não perca a disposição para se manter na luta pela defesa de uma perspectiva de gestão pública socioambiental. Até agora travamos “apenas” uma intensa batalha. E mais estão na esteira, exigindo de nós posição e contra ataque.
*André Café é presidente da Associação dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA, no Distrito Federal (Asibama-DF).
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::
Edição: Márcia Silva