Médicos da rede pública de saúde do Distrito Federal entraram em greve a partir dessa terça-feira (3) para alcançar reajuste salarial. A categoria também reivindica melhorias das condições de trabalho, mais investimentos no SUS e contratação de mais médicos.
A decisão foi tomada em assembleia realizada em frente ao prédio da Secretaria de Estado de Saúde (SES-DF), onde estiveram presentes mais de 800 profissionais da saúde e apoiadores, de acordo com o sindicato. O engajamento da categoria deste ano é a maior já registrada pelo Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), desde a década de 1990.
“Tivemos grande adesão. As equipes de mobilização começaram a percorrer os hospitais e demais unidades de saúde para reforçar o movimento”, informa Gutemberg Fialho, presidente do sindicato.
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Integrantes do comando de greve foram recebidos pelo secretário de Economia, Ney Ferraz, para negociar a proposta de reajuste reivindicada. “Foi o início de um diálogo que há muito tempo o Sindicato vem tentando iniciar”, aponta Gutemberg.
No final da tarde desta terça (3), representantes dos médicos se reuniram com a secretária de Saúde, Lucilene Florêncio, e com o subsecretário da Gestão de Pessoas da SES-DF, João Eudes. Durante o encontro, foi comunicado que a proposta dos médicos será discutida com a Secretaria de Economia e com outros setores do governo, após uma avaliação do impacto orçamentário. Uma nova reunião entre os representantes da categoria médica e do governo será agendada após essa análise, ainda sem data definida.
Apesar de a SES-DF declarar estar aberta para negociações, o SindMédico-DF afirma que o GDF ignorou o último pedido de audiência para apresentar as reivindicações dos médicos que atuam no serviço público de saúde do DF, solicitada há duas semanas. Gutemberg considera lamentável, porém urgente, a medida de greve para iniciar as negociações após vários anos de esforço frustrado de negociação com o governo.
Em abril deste ano, na tentativa de avançar na proposta, o sindicato recorreu ao Ministério Público do Trabalho como mediador. No entanto, até o momento, o Governo do Distrito Federal não designou um representante qualificado para liderar as conversações.
“Infelizmente, foi necessário chegar ao movimento grevista para que o passo inicial do governo nas negociações fosse dado. Isso demonstra que é fundamental reforçar e dar seguimento à mobilização”, declarou.
Agenda da greve
Com a paralisação, os médicos não estão presentes no local de trabalho e não batem o ponto. Todos os grevistas estão se concentrando em locais estratégicos ao longo semana para recolher assinatura e apoio.
Na quarta-feira (4), a categoria organizada esteve presente no estacionamento do Hospital Regional da Asa Norte, onde ocorreu a coleta de assinaturas no livro de ponto de greve. Na quinta-feira, a coleta de assinaturas continuará na concentração em frente ao Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). Por fim, na sexta-feira, o ponto de greve será estabelecido no Hospital Regional de Taguatinga (HRT).
Questão jurídica da greve
Na semana passada, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), através do desembargador Fernando Habibe, considerou ilegal a continuação da greve dos servidores. Apesar da proibição, a categoria não acatou a decisão, levando o magistrado a aumentar significativamente a multa por descumprimento. Na sexta-feira (30/8), a penalidade diária foi elevada de R$ 50 mil para R$ 200 mil.
Em meio a esse impasse legal, o SindMédico-DF anunciou que a paralisação será por tempo indeterminado até o objetivo ser devidamente cumprido. Por sua parte, a Secretaria de Saúde manifestou em comunicado que "tem se esforçado para atender as demandas da categoria". A direção sindical orienta que “a greve será interrompida somente por decisão de assembleia! A decisão judicial de ilegalidade da greve não determina o fim do movimento reivindicatório”.
Na ação judicial movida contra a greve dos profissionais de saúde, o Governo do Distrito Federal (GDF) argumentou que a presença integral do corpo médico "é essencial para a apropriada prestação de serviço público à população" e alegou que atender ao pedido dos grevistas traria implicações no orçamento, pois "afetará o delicado equilíbrio financeiro das contas públicas".
Sobrecarga e condições de trabalho
O déficit de médicos e outros profissionais de saúde no SUS do DF tem se agravado segundo as denúncias dos profissionais. Em junho as categorias de técnicos e auxiliares de enfermagem paralisaram por melhores salários e condições de produção. Atualmente é a vez de os enfermeiros também cruzarem os braços pelos mesmos motivos.
Os profissionais são unânimes em solicitar a contratação de novos trabalhadores da saúde para resolver demandas que aumentam diante de crises sanitárias como a Covid-19, a recente epidemia de dengue e catástrofes ambientais. O Sindmédico aponta para a baixa contratação como um dos principais problemas.
Em 2014, a SES-DF contava com 5.546 médicos em seu quadro; atualmente, esse número reduziu para 4.197, com quedas notáveis em 21 especialidades. Apenas as áreas de medicina de família e comunidade e medicina de emergência mantiveram seus números estáveis.
A Estratégia Saúde da Família (ESF) revela que, atualmente, 24% da cobertura médica no DF é assegurada por programas federais como Mais Médicos e Médicos pelo Brasil. O governo do DF alega que há desinteresse dos profissionais em atuar no serviço público.
Contudo, os dados do último concurso para a carreira médica, realizado em 2022, mostram o contrário: 4.597 médicos se inscreveram para disputar 381 vagas oferecidas pela SES-DF. Apesar do alto número de candidatos, muitos médicos desistiram de assumir os cargos ou deixaram suas posições logo após a posse, alegando salários defasados, infraestrutura inadequada e sobrecarga nas unidades de saúde.
A SES-DF registra uma significativa redução de seu quadro médico, com uma perda de 24,3% dos profissionais em comparação a 2022. Em 2018, o Fundo Constitucional do DF era responsável por 43,76% do financiamento dos gastos públicos com saúde, enquanto o restante vinha principalmente do Tesouro do DF.
De 2018 a 2023, a participação do Fundo Constitucional aumentou para 65,61%, indicando uma diminuição significativa nos recursos locais destinados à saúde. Paralelamente, a folha de pagamento da SES-DF sofreu cortes, com os salários dos médicos passando a representar apenas 25% do total, uma redução de 16 pontos percentuais. Essa redução salarial, de acordo com o sindicato, reflete a crescente migração de profissionais para o setor privado.
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Edição: Flávia Quirino