Centenas de pessoas se juntaram a grupos musicais, vendedores ambulantes e parlamentares, neste domingo (8), em ato em defesa das atividades culturais no Eixão do Lazer, em Brasília. A ocupação, articulada por movimentos sociais, aconteceu após o Governo do Distrito Federal (GDF) proibir eventos culturais e comércio ambulante no local.
“O Eixão pede passagem para que a cidade flua livre, as pessoas possam andar de bicicleta, tocar sua música, tomar sua cerveja, correr, caminhar, ser felizes. A cidade é nossa, a gente precisa ocupar os espaços que ainda são nossos, que são de resistência e que, de alguma forma, protegem os trabalhadores e trabalhadoras dessa cidade também. Aqui a gente pode ter espaço de liberdade democrática e popular”, protestou Katia Garcia durante o ato.
No último dia 1º, domingo, uma ação do GDF retirou comerciantes do Eixão, com ameaça de recolhimento de mercadorias, e encerrou as atividades musicais e culturais no local. A ação, baseada em um decreto emitido pelo governador Ibaneis Rocha durante a pandemia e realizada pelo Departamento de Estradas de Rodagem do DF (DER-DF), DF Legal e a Política Militar, foi considerada truculenta por quem estava lá.
Para Márcia Alecrim, artesã que expõe e realiza atividades culturais no Eixão há oito anos, a ação foi uma “expulsão”.
“Eu me senti como uma bandida. Marginal eu sou, porque viver de arte neste país significa viver à margem da sociedade, mas eu não sou bandida. É como eu trabalho. Com a minha renda, eu sustento a minha filha. Eu sou uma mãe solo, uma mulher negra da periferia, e me senti muito agredida. Hoje eu estou aqui como um ato de resistência e vou estar hoje, domingo que vem e todos os outros domingos, porque aqui é meu ganha-pão”, defendeu.
A ação do GDF aconteceu sem aviso prévio e foi apresentada como um ato de fiscalização e orientação. “E não foi isso que aconteceu”, relatou Ângela Rangel Santos Valenzuela, que atua no Eixão há quatro anos. “Eles já chegaram com caminhões, tratores, viaturas de polícia”, contou a comerciante. Segundo ela, os agentes do GDF afirmaram que a ordem do governador era “retirar tudo”, caso contrário, a mercadoria seria apreendida, e que se houvesse resistência fariam uso da força.
“A gente tentou retirar o mais rápido que a gente pôde, até porque ninguém queria arrumar nenhum tipo de conflito, porque a gente está aqui querendo trabalhar de forma decente, de forma organizada e de preferência regularizada. Todo mundo aqui está realmente tentando levar a vida, fazer a economia girar”, completou Ângela.
A mobilização continua
Segundo a produtora cultural Natália Stanzioni, uma das articuladoras do Ocupa Eixão, a mobilização em defesa da culturais e do comércio no local continuarão. Movimentos sociais pretendem se reunir nesta semana para elaborar um calendário de atividades a serem realizadas ao longo do mês.
Na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), a ação do GDF foi debatida em diferentes sessões e parlamentares apresentaram projetos de decreto legislativo (PDL).
A ação do dia 1º foi realizada com base no decreto 40.877, publicado em junho de 2020, no auge da pandemia do covid-19, que proibia a comercialização de produtos por vendedores ambulantes e a prática de atividades recreativas e esportivas que gerem aglomeração.
Este decreto foi derrubado na última terça-feira (3) por pressão dos deputados distritais. No mesmo dia, o governador publicou novo decreto regulamentando as atividades no Eixão do Lazer.
O texto define que DER-DF deverá elaborar, em até 30 dias, um “Plano de Uso e Ocupação”, que elencará quais atividades serão autorizadas no local. Não está prevista a participação da população na elaboração do documento.
Além disso, o plano definirá as regras para distribuição e comercialização de produtos no Eixão. Até que seja publicado, segundo o texto, o DER-DF poderá conceder autorizações provisórias para atividades comerciais.
O decreto estabelece caminhadas, corridas e uso de bicicletas e de outros veículos não motorizados como as atividades de lazer permitidas no Eixão, além das que serão definidas no Plano de Uso e Ocupação.
Tal rol de atividades autorizadas foi criticado pelo deputado distrital Gabriel Magno (PT-DF). Segundo ele, o decreto exclui a realização de comemorações de aniversário, piqueniques, apresentações musicais e outras manifestações culturais. “Isso é ilegal”, criticou. Magno apresentou outro projeto de decreto legislativo (PDL) alterando o texto, que segue em tramitação na CLDF.
Após a repercussão negativa da ação do GDF, o governador tenta mudar o tom. “[A ação foi orientada] apenas a organizar o comércio no local, que será mais funcional na medida em que possamos cadastrar e regularizar a atividade. Nada que retire do Eixão seu caráter de espaço de convivência democrática, de criatividade, com liberdade e segurança”, comentou Ibaneis em uma rede social.
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Edição: Flávia Quirino