Moradores de regiões vizinhas ao Parque Ecológico das Garças, situado no Lago Norte em Brasília, se mobilizam contra um projeto urbanístico do Governo do Distrito Federal (GDF) que pretende realizar parcelamento do solo para construção de unidade imobiliária, lotes para comércio e estacionamento em área do parque. Para os residentes, o projeto também poderá causar um forte impacto ambiental ao Parque, além de fomentar a especulação imobiliária.
Nesta quinta-feira (25), o Plano de Ocupação para a Unidade Especial 4 – Polo 1 do Lago Norte foi aprovado, de forma unânime, em reunião extraordinária do Conselho de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal (Conplan). O plano estabelece que Lago Norte terá um novo local para esportes aquáticos, lazer e gastronomia na orla do Lago Paranoá.
A área de 53.184,95 m² prevista no plano é localizada no Setor de Habitações Individuais Norte (SHIN), nos trechos 15 e 16, e fica ao lado do Parque Ecológico das Garças. Como argumentos, o GDF estabelece que, apesar de já ser utilizada pela população para caminhadas, pedaladas e esportes como vela e windsurf, o espaço possui infraestrutura precária, com poucos bancos e sanitários, e sem serviços disponíveis em seu entorno imediato.
Para o presidente da Associação Prefeitura da Península Norte, Antônio Filho, o interesse do GDF com o plano é abrir uma área empresarial. “Uma coisa que observamos no Lago Norte é que o comércio não expande porque não tem clientela. Essa é uma área com pouca vocação comercial, pois o comércio não atenderia muitas pessoas. Agora, como parque expandido, é mais interessante enquanto área de lazer natural para a população”, explica Antônio que também integra o Movimento de Defesa do Parque das Garças.
'Interesses do GDF não são os interesses da comunidade'
Segundo o Relatório Ambiental Simplificado (RAS), apresentado pela Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), o parcelamento em questão destina-se à criação de unidade imobiliária para o Parque Ecológico das Garças, “e de mais 05 (cinco) lotes para usos comerciais e de serviços, além de áreas destinadas a estacionamento, bicicletário, vias de circulação, áreas verdes e espaços livres de uso público”.
Para Doralvino Sena, coordenador do Movimento de Defesa do Parque das Garças e representante do Lago Norte no Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT), a ideia do GDF é “deixar a coisa sucateada e desestruturada e, depois, aparecer com essa solução mágica de privatização da área”.
“Os interesses do GDF não são os interesses da comunidade, da população do Distrito Federal e do Entorno. Nosso interesse é essa integração ao parque de toda aquela área para ficar uma espécie de um triângulo na ponta da península do Lago Norte, além de que ele cumpra essa vocação, ou seja, ser sustentável, aprazível e de convívio de toda comunidade com a natureza”, destaca.
Após a aprovação do Conplan, o plano precisa ser ratificado por uma portaria da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh), que será publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF). A definição dos parâmetros urbanísticos para o local possibilitará à Terracap dar continuidade aos estudos e ao planejamento para, futuramente, realizar a concessão desta área em parceria com a iniciativa privada.
'Salve o Parque das Garças'
O Movimento de Defesa do Parque das Garças também informa que o projeto pretende ofertar imóveis para uma parcela da população do DF que não precisa.
“Para se ter uma ideia do absurdo que está acontecendo no DF, o PDOT estabelece áreas parceláveis que dá para cerca de 10 milhões de habitantes. Passados mais de 60 do início da nossa capital, ainda não temos 3 milhões”, destaca o Movimento de Defesa do Parque.
Doralvino Sena lembra que o parque não é ocupado apenas por moradores do Lago Norte, sendo que a maioria dos visitantes são de várias regiões administrativas do Distrito Federal, como Gama e Sobradinho. “Inclusive, tem pessoas que vem de fora, como Formosa. A gente descobriu conversando com as pessoas, de que eles vão lá porque é uma área tranquila. E o GDF quer transformar aquela área em uma espécie de ‘Pontão do Lago Norte’”, diz o coordenador.
O Movimento de Defesa do Parque das Garças também organizou um abaixo assinado, intitulado "Salve o Parque das Garças". Atualmente, o documento já conta com quase 20 mil assinaturas, sendo 12.896 virtual e 4.500 assinaturas em meio físico.
O texto do abaixo assinado estabelece que o Movimento é contrário à implantação do projeto e propõe a ampliação da área do Parque Ecológico das Garças, pela incorporação da área situada entre os atuais limites do Parque e do Clube do Congresso, anteriormente ocupada pelo clube.
No domingo (29), às 9h, o Movimento de Defesa do Parque das Garças realiza um encontro para debater sobre o Plano aprovado no Conplan com a comunidade que frequenta o espaço.
Parque não tem Plano de Manejo
O projeto também pode gerar impactos ambientais na bacia do Lago Paranoá, no braço ainda preservado e onde se tem captação de água para o abastecimento humano. Além disso, a remoção da vegetação diminui a infiltração de água no subsolo, reduzindo a recarga do aquífero. Também pode haver poluição da água subterrânea por penetração de substâncias utilizadas nas obras, o que poderá escoar para o lago Paranoá, que também será impactado pelo assoreamento.
Doralvino Sena também lembra que o Parque das Graças é uma Área de Proteção Ambiental (APA) e uma zona de amortecimento. Para ele, nada deveria ser construído na região. “Do outro lado, temos a orla do lago, então, eles estão descumprindo a legislação. Esse projeto não possui relatório de impacto na vizinhança, na mobilidade, nem relatório de impacto ambiental. Estão totalmente desprovidos de cobertura legal para o que estão fazendo”, relata.
Atualmente, o Parque Ecológico das Garças não possui Plano de Manejo, instrução normativa necessária que estabelece o zoneamento e as normas que norteiam o uso. Na prática, o plano determina o que pode ou não ser feito em áreas de preservação ambiental. A responsabilidade de elaboração do documento é do Instituto Brasília Ambiental (Ibram). De acordo com informações disponíveis no site institucional do Ibram, existem 86 Unidades de Conservação no DF, no entanto apenas 40 contam com plano de manejo.
Questionado pelo Brasil de Fato DF sobre a elaboração do plano de manejo do Parque das Garças, o órgão ambiental apontou que está em fase de "pré-planejamento, e que, em breve, a comunidade poderá participar de uma oficina participativa, prevista para início de 2025".
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::
Edição: Flávia Quirino