Vivemos em uma sociedade que continuamente desvaloriza as capacidades e conquistas de pessoas negras
Luto contra mim mesmo para dialogar contigo quando olho para o espelho. Embora todos possamos duvidar de nós mesmos de vez em quando, a Síndrome do Impostor nos ocupa e paralisa. Este sentimento é caracterizado por uma crença persistente de que você não é capaz, mesmo quando há evidências claras do contrário e, especialmente quando se está enfrentando um novo desafio ou em situações de alta pressão, ou mesmo ao se abrir para outras pessoas.
No entanto, se você se sente constantemente como uma fraude, independentemente da sua trajetória, mesmo com seus resultados, isso pode ser um sinal de que você está lidando com essa problemática que muitas pessoas enfrentam em silêncio, privando-se de compartilhar diversas reflexões.
Também é sintomático como lidarmos com o sucesso, mesmo quando superamos a primeira dificuldade de produzir, segue a dificuldade de se reconhecer como uma pessoa digna de reconhecimento. Há uma tendência a desvalorizar as conquistas, atribuindo-as a qualquer coisa além de seu próprio trabalho em meio a todas as dificuldades materiais e emocionais.
Esse sentimento pode afetar sua vida de diferentes formas; nossa auto descrença é paralisante. Procure ajuda. Que esse texto curto possa te lembrar de sua capacidade e que é nobre buscar ajuda profissional de saúde mental. Sem dúvidas, você encontrará apoio e as ferramentas necessárias para superar essa síndrome e recuperar a sua confiança para seguir assumindo novos desafios, sem prejudicar sua produtividade ou causar angústia significativa.
No livro "Introdução ao conceito de Quilombo", Beatriz Nascimento (1942-1995), lembra que o racismo não é apenas um preconceito individual, mas uma estrutura que organiza as desigualdades que edificam a sociedade brasileira.
É fácil associar um reflexo do racismo estrutural (não podemos generalizar, mas também não é difícil pensar), que algumas pessoas conseguiram chegar a determinadas posições ou reproduzem diversas problemáticas livremente por serem brancas.
Vivemos em uma sociedade que continuamente desvaloriza as capacidades e conquistas de pessoas negras, e isso provoca um sentimento de inadequação que gera uma autodepreciação sobre as conquistas feitas com todas as dificuldades inerentes. A constante mensagem de que "não pertencemos" aos espaços de poder e saber reforça essa autoimagem negativa, tornando-se uma manifestação subjetiva dessa depreciação e reforçando as desigualdades raciais.
Pretoguês
Para escrever foi muito confortante dialogar com a obra de Lélia Gonzalez, pois toca o psique negro quando fala do conceito de 'pretoguês', que evidencia como o racismo permeia até nossa fala e expressividade, silenciando e subestimando os saberes das pessoas negras. O efeito disso se reflete na dificuldade de se reconhecer como capaz e digno de sucesso, olhando o branco como ideal.
No Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo, temos na bandeira um casal de pessoas brancas, mas sua base, como a maioria da população brasileira, é de pessoas negras. Será que isso não é algo a ser dialogado com as milhões de pessoas?
Espero que na luta possamos com essas autoras e com nosso espelho lembrar da importância de descolonizar nossas mentes e de buscar suporte para romper com esses mecanismos, reafirmando a necessidade de cura mental em uma sociedade que insiste em nos fazer sentir menores e não a maioria da população.
Essa mesma sociedade, também nos mata, vulgarizando a morte de pessoas negras todos os dias nos jornais que chegam a esperar sangue, em extrema maioria de jovens pessoas negras mortas pelo Estado.
Essa eliminação refletida de modo magistral por Abdias do Nascimento na obra “O Genocídio do negro brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado” como uma ação naturalizada na sociedade brasileira que desumaniza ao ponto que a eliminação não causa comoção. O resultado, a angústia e a noção de morte presente em toda vida, algo adoecedor à população negra e “invisível” quando visibilizado considerado “mimimi”.
Na luta nessa caminhada, incentive as pessoas a refletir sobre suas conquistas e habilidades.
Celebremos esse sucesso. Estar vivo é resultado de luta constante que nos exige constante aprendizado. Reconhecer esses pensamentos e sensações é um grande passo, a autossabotagem pode nos permear de forma sorrateira, é preciso estarmos atentos, para que não sejamos nossos maiores inimigos. Venceremos.
*Rafael Bastos é pai de Iracema e Omar, cientista social e militante do MST do Distrito Federal e Entorno.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.
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Edição: Márcia Silva