Brigadistas florestais de todo o Brasil estiveram presentes, nesta semana, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), com o objetivo de conscientizar a população e os órgãos governamentais sobre as necessidades e condições de trabalho da categoria em todo o país. A mobilização ocorreu em resposta às recentes queimadas que atingiram o Brasil e às mortes de profissionais durante o combate aos incêndios.
Os brigadistas se reuniram em um acampamento, de segunda-feira (30) a quinta-feira (3), para também pedir que o projeto de Lei (PL) n.º 3621, de 2024, seja aprovado no Congresso Nacional. A proposta, elaborada pela deputada federal Célia Xakriabá (Psol-MG), dispõe sobre a criação, regulamentação e medidas de valorização, proteção e promoção da profissão de brigadistas florestais.
Para Odair Trindade, representante do Movimento Sindical dos Brigadistas Florestais do DF, as principais reivindicações do acampamento desta semana foram cobrar a votação do projeto de lei e homenagear os profissionais que morreram em combate às queimadas. “Este ano, perdemos seis brigadistas, o que foi um recorde. Além disso, há outros acidentes dos quais não temos conhecimento. São óbitos de pessoas que morreram queimadas ou assassinadas, inclusive. O foco do movimento é expor à sociedade tanto o PL quanto a memória dos que já morreram.”
Em agosto deste ano, uma portaria do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), publicada no Diário Oficial da União, aumentou para 2.227 o total de brigadistas a serem contratados para combaterem incêndios florestais em todo o Brasil. Além do Ibama, a brigada federal também conta com os profissionais do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Também há os profissionais dos órgãos estaduais e distritais. Neste ano, o Instituto Brasília Ambiental (Ibram), abriu contratos temporária para150 brigadistas florestais.
Com isso, a ação da categoria reforçou a necessitamos de que seja cumprido os direitos trabalhistas dos diversos brigadistas florestais por todo Brasil.
"Arriscamos nossas vidas pela preservação dos biomas brasileiros sem respaldo de nenhuma lei. Pela vida de nossos cangas, que morreram em combate, nestas últimas queimadas, bem como em outras, pedimos socorro", destaca o movimento sindical.
Ausência de direitos
Atualmente, os brigadistas são contratados em regime temporário. Trindade conta que, antigamente, o acordo era de seis meses, apenas no período da seca. Depois, aumentaram para um ano, e, em seguida, para dois anos, como no ICMBio. Hoje, são contratos de três anos, mas todos temporários. “Isso significa que não temos nenhum embasamento legal, nenhum direito a rescisão de contrato, nada. Apenas o salário do mês e acabou, porque não estamos respaldados pela CLT”, lembra.
O projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados aponta que os brigadistas florestais devem ser profissional devidamente capacitado e certificado em curso de formação especializado na prevenção, controle e combate aos incêndios florestais. Além de estabelecer que eles devem estar aptos a executar as atividades de prevenir, controlar e combater incêndios florestais; coletar, sistematizar e analisar dados sobre incêndios florestais e o manejo integrado do fogo.
A proposta também indica que a categoria deve conduzir ações de sensibilização e educação ambiental para promover a conservação e o uso sustentável das florestas; executar e monitorar planos de manejo integrado do fogo e planos operativos para incêndios; fornecer suporte às áreas protegidas conforme os planos de manejo e prevenção integrado do fogo ou plano operativo de prevenção e de combate aos incêndios florestais e fornecer primeiros socorros em caso de incidentes ou acidentes relacionados ao trabalho.
Com seis artigos no total, Trindade explica que o projeto foi elaborado de uma “maneira muito enxuta”, com objetivo de evitar entraves nas Comissões no Congresso Nacional. "O primeiro artigo trata da criação e regulamentação da profissão de brigadista, que ainda não é regulamentada. Com isso, a profissão será criada e protegida", destaca.
O cenário também muda em cada estado. No Tocantins, Juciely Rocha, brigadista e educadora florestal, em Palmas, conta que o contrato é de cinco meses, durante o período de fogo. "Após isso, os brigadistas ficam sem trabalho, realizando outras atividades. Quando chega o período de fogo, todos voltam para o combate", diz a profissional.
Ela também relata que, além da falta de uma profissão justa, a categoria também sofre com a questão da falta de Equipamento de Proteção Individual (EPIs). Segundo Juciely, muitas vezes, os brigadistas vão ao combate sem equipamentos de qualidade. "Até o carro de combate não é adequado. Recentemente, recebemos kits de primeiros socorros para emergências, mas há muitas questões que precisam da regulamentação da lei para podermos trabalhar adequadamente", destaca.
Maior onda de incêndios florestais
O Brasil atravessa um momento delicado devido às queimadas. De janeiro a agosto de 2024, os incêndios no Brasil já atingiram 11,39 milhões de hectares do território do país, segundo dados do Monitor do Fogo Mapbiomas. Apenas neste ano, 70% da área queimada no Brasil foi de vegetação nativa.
Trindade lembra que a prevenção ambiental é outro ponto importante na regulamentação da profissão. Para ele, se os brigadistas trabalhassem com educação ambiental, preservação e monitoramento de áreas afetadas, haveria menos incêndios. “O bioma, o meio ambiente, é anual, ele não tem sazonalidade. Ele queima, se refaz, e é contínuo. O trabalho de reflorestamento das áreas afetadas é necessário o ano todo, mas isso exige gestão. Portanto, essa questão dos contratos temporários durante o período de fogo demonstra uma apatia do sistema. Por isso estamos aqui, pela aprovação da PL, para mudar esse cenário que nos prejudica”, destaca.
:: 70% das queimadas no Brasil em 2024 destruíram vegetação nativa ::
As dificuldades das queimadas degradam o solo, a vegetação, fauna, afetam a qualidade do ar, além de contribuir para problemas respiratórios e outras condições de saúde. Em relação à categoria, Juciely conta que o adoecimento deles vai desde conta da fuligem nos olhos, esforço físico ao carregar bombas por quilômetros dentro da mata, e que, muitas vezes, não são terrenos planos, além do risco de queimaduras de primeiro grau. “Esses são problemas que não surgem de imediato, mas com o tempo. E nós não temos nenhuma assistência mínima”, diz.
A educadora florestal também relata que, atualmente, os brigadistas devem apresentar um seguro de vida para serem contratados, que cobre alguns acidentes que podem ocorrer durante o trabalho. Ela explica que algumas circunstâncias que podem ocorrer durante o trabalho, mas, como não há direitos nem plano de saúde, os profissionais ficam expostos.
“Na nossa região, por exemplo, arriscamos levar tiros de trabuco dentro da mata, porque há muita caça. Eles deixam armadilhas, e nós, ao combater os incêndios, corremos esse risco. Se alguém morrer, a família recebe uma indenização de R$ 10 mil, o que é muito pouco. Não é necessário um seguro caro, apenas algo que ofereça algum amparo, pois não somos contratados sem ele”, diz a brigadista.
Carta aberta aos parlamentares
Durante ação dos brigadistas, também foi entregue uma carta aberta às autoridades de pedido de visibilidade aos brigadistas florestais de todo território nacional. O documento reuniu 35000 assinaturas no abaixo-assinado. O documento aponta que o termo de prestação de serviço voluntário de brigadistas de incêndio florestal não gera vínculo empregatício, o que prejudica os profissionais, já que não possuem nenhum respaldo legal.
Agora, a categoria aguarda ser atendida pela ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva. Segundo os brigadistas, a ministra já sinalizou que deve ouvir os profissionais. "Vamos tentar marcar também com outros parlamentares que estamos mapeando", relatam.
O evento realizado pelos brigadistas contou com a presença dos profissionais, apoiadores e a população em geral. O representante do movimento sindical lembra que manifestação foi pacífica e visa dar visibilidade às demandas por melhores condições de trabalho, equipamentos e reconhecimento para esses profissionais que atuam na prevenção e combate a incêndios florestais e conforme descrito, perdem suas vidas, invisibilizados, nossos heróis
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Edição: Márcia Silva