Distrito Federal

racismo religioso

Escola denuncia racismo e intolerância religiosa em vídeo publicado por deputado distrital

Parlamentar acusou professora de obrigar alunos a realizar "rituais" e cultuar entidades de religiões afro-brasileiras

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Gravações não autorizadas foram feitas durante aula da disciplina eletiva de História e Cultura Afro-brasileira e Indígena - Foto: Renato Araújo/Agência Brasília

Parlamentares criticaram, durante sessão ordinária realizada na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) nesta terça-feira (29), o deputado distrital Pastor Daniel de Castro (PP-DF) por ter exposto uma professora da rede pública de ensino. Em vídeo publicado em uma rede social na semana passada, Castro alega que a docente estava obrigando estudantes a realizar rituais e cultuar entidades de religiões de matriz africana. 

Segundo o deputado distrital Gabriel Magno (PT-DF), a Comissão de Educação, Saúde e Cultura da CLDF recebeu uma denúncia do caso, feita pelo Centro Educacional do Lago (CEL), onde a aula foi ministrada. A escola afirma que o vídeo expressa "um preconceito claro e inaceitável" contra os cultos afro-brasileiros. 

Para Magno, a atitude de Castro representa uma forma de tentar “amordaçar professores”. “É [um vídeo] carregado de racismo, de preconceito, porque quer comparar ou tentar traduzir que religiões matriz africanas são rituais de magia ou que a professora tentou obrigar estudantes a cultuar a religião. Não foi isso que aconteceu”, afirmou o deputado. 

No vídeo publicado por Daniel de Castro, há imagens de folhas de árvores no chão de uma sala de aula e áudios que supostamente são gravações da aula. Segundo o pastor, a cena representa a realização de “rituais”, em que os estudantes eram obrigados a “cantar hinos dessas culturas” e “dizer nomes dessas entidades”. O parlamentar acusa a professora de ferir a laicidade do Estado. 

Castro afirma ainda que encaminhou denúncia contra a professora ao Ministério Público do DF (MPDFT), à Secretaria de Educação (SEEDF) e à Regional de Ensino. “Eu fiz o meu papel como cristão, pedagogo e advogado. Lá tem alunos evangélicos e eles não são obrigados a participar disso”, afirmou durante a sessão na CLDF. 

Ao contrário do que o parlamentar alega, a atividade faz parte de uma disciplina não obrigatória. “É uma disciplina que está prevista no currículo da Secretaria de Educação e nas diretrizes curriculares nacionais: ‘História e Cultura Afro-brasileira e Indígena’”, explicou Gabriel Magno. 

Na própria publicação do vídeo na rede social do pastor, há comentários de várias pessoas que se identificam como estudantes da instituição de ensino e afirmam que a disciplina faz parte da cadeia eletiva e que as imagens apresentadas estão descontextualizadas. 

“Tudo tirado de contexto! A aula da professora é para informar sobre a cultura africana. Na nossa escola somos muito bem informados sobre tudo, e por que a cultura africana não seria uma delas? E ainda mais tudo que ela está informando está de acordo com o currículo da Secretaria de Educação!”, diz um comentário. 

“Que mentira! Usando vídeos não contextualizados para usar em sua narrativa preconceituosa! Sou aluna do CEL, e não sei se sabe mas no novo ensino médio os alunos podem montar seu horário com as eletivas que os interessam, e justamente a eletiva dessa professora trata de assuntos relacionadas à cultura afro-brasileira, quem está lá está interessado em aprender sobre (ou pelo deveria)”, afirma outra pessoa que se identifica como estudante da instituição. 

O deputado distrital Fábio Félix (Psol-DF) também criticou a atitude de Castro, afirmando que o parlamentar utilizou vídeos descontextualizados para atacar a professora “de forma desproporcional”. “Como uma educadora vai responder a uma rede de ódio que um parlamentar é capaz de fazer em suas redes [sociais]?Isso é muito preocupante”, argumentou. 

“As culturas afro-brasileiras, as religiões de matriz africana e os povos tradicionais são vítimas, infelizmente, de uma série de ataques a sua existência e religiosidade. Hoje, é preciso afirmar dentro da educação a nossa diversidade religiosa, pois tem setores extremistas que atacam essa diversidade”, avaliou.

Disciplina é amparada pela legislação

A gestão do CEL se manifestou nesta terça-feira (29), repudiando a “série de ataques, acusações caluniosas, racistas e de intolerância religiosa contra servidores públicos no exercício de suas atribuições” feitas pelo deputado distrital no vídeo. 

A escola afirmou que “apoia e respalda” as práticas da professora atacada e apontou que o conteúdo trabalho na disciplina História e Cultura Afro-brasileira e Indígena está de acordo com a legislação nacional e distrital. 

A obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileiras e indígena nas escolas está prevista nas leis nº 10.639/2003  e nº 11.645/2008.

“Acreditamos em uma educação libertadora, antirracista, feminista, para a igualdade de gênero e que valoriza a ciência”, disse a instituição de ensino.

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Edição: Flávia Quirino