Uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) revelou graves problemas de segurança, acessibilidade, infraestrutura e tecnologia em escolas públicas do DF. O órgão destaca que os resultados da fiscalização “evidenciam desigualdades, riscos à segurança dos alunos e funcionários das escolas, além de prejuízo à aprendizagem e à saúde dos estudantes”.
O coordenador do Fórum Distrital de Educação (FDE), Júlio Barros, avalia que as condições de infraestrutura das unidades escolares “como uma situação caótica! A maioria das escolas do DF necessitam de reformas estruturais, como por exemplo, nas partes elétrica e hidráulica, como muitos vazamentos, com encanações muito antigas”.
Segundo ele, a infraestrutura causa e agrava outros problemas no processo de ensino e aprendizagem. “Os profissionais de educação são expostos diariamente à riscos de sua integridade física, em todos os sentidos, até mesmo, mental. O FDE acredita que é fundamental a educação como prioridade na prática e não somente em discursos de campanha eleitoral”, explica o professor.
Questão orçamentária
Segundo Barros, todas as situações apontadas pelo Tribunal de Contas “são, em sua amplíssima maioria, previstas no Plano Distrital de Educação, por meio de suas 21 metas e 411 estratégias. Agora é fundamental ter vontade política e não deixar o PDE se transformar em letra morta!”.
Na avaliação majoritária do Fórum, todo o Plano, estabelecido em 2015, tem regredido em eficiência nos últimos cinco anos devido à retração orçamentária. Por conta disso, há desde o ano passado um estado de greve e mobilizações por parte de professores e orientadores da rede pública em busca reajuste salarial e investimentos de acordo com o plano.
“Sem financiamento da educação, como por exemplo, a meta 20, que prevê dobrar o investimento na educação tendo como parâmetro o PIB, quase todo o PDE ficará comprometido, e não somente, nas questões de estrutura física, mas como também, nos aspectos pedagógicos, que se refletem no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB)”, afirma Barros.
O coordenador da Secretaria de Políticas Sociais do Sinpro-DF, Raimundo Kamir, analisa que, sobre o orçamento, “o percentual caiu de 3,1% do PIB para 2,6% no governo Ibaneis. Hoje, o investimento constitucional mínimo é de 25%, mas há manobras contábeis, como incluir o passe livre e o orçamento da Universidade Distrital dentro do orçamento da educação básica”.
Segundo ele, essa prática “não é permitida e, se excluirmos esses itens, o percentual fica bem abaixo do constitucional. A Câmara Legislativa precisa corrigir essa distorção, que comprova a falta de compromisso com a educação”.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 prevê uma redução de R$ 52,7 milhões nos fundos destinados à educação no âmbito do Fundo Constitucional do DF.
Enviada pelo Executivo à Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) em 15 de setembro, a proposta contraria uma expectativa de incremento de mais de R$ 300 milhões, sugerida pelo próprio governo durante as discussões da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2025 no primeiro semestre.
O PLOA 2025 fixa o percentual mínimo constitucional para a educação em 25,32% do orçamento, o menor registrado na história do DF. Em contrapartida, a proposta inclui um aumento expressivo, de mais de 400%, nas renúncias fiscais, atingindo R$ 7,2 bilhões.
Infraestrutura
A equipe de fiscalização do TCDF registrou diversos casos de má estrutura nos blocos escolares. Um dos dados mais alarmantes destaca que “95% das escolas vistoriadas pelo TCDF, não havia licença do Corpo de Bombeiros Militar do DF atestando a segurança e as condições dos sistemas de prevenção e combate a incêndio”. Também foi marcada a ausência de botão do pânico, item de segurança considerado essencial, em 82% dos locais fiscalizados e de câmeras de vigilância em 32%.
O relatório da auditoria destaca “inadequações em 34% das coberturas e 39% dos pisos de entrada das escolas vistoriadas”. Segundo o informe, algumas escolas “apresentam risco real de desabamento dessas estruturas, além de potenciais problemas com infiltrações, mofos e danos a equipamentos”.
Buracos, muros quebrados ou aberturas indevidas que facilitam o acesso de estranhos, foram localizados em 34% das escolas vistoriadas. Inadequações foram localizadas em 58% das quadras poliesportivas e 42% dos parques infantis durante as vistorias.
De acordo com o Tribunal, há uma alta carência de rampas de acesso adequadas em mais da metade das escolas visitadas. Também foi verificado “a falta de adaptações para pessoas com deficiência (PcD) em 66% das salas de aula e 44% dos banheiros. Foi identificada durante as visitas a ausência de sinalizações tátil e visual em 83% e 77% das escolas visitadas respectivamente”.
Oferta de vagas
Outro problema identificado foi a execução de obras de infraestrutura com objetivo de suprir as demandas por vagas. Há mais de cinco anos que os canais de informação dos professores denunciam o excedente de alunos em relação à capacidade de acomodá-los e consequente superlotação das salas de aula no DF.
A fiscalização do TCDF revelou que, atualmente, das 222 obras previstas, pouco mais de 15 foram concluídas. De acordo com portal do Sindicato dos Professores, “turmas dos anos finais do Ensino Fundamental ou Ensino Médio com até 45 estudantes. O ideal seria, no máximo, 35. Anos iniciais do Ensino Fundamental, em que as crianças precisam de mais atenção da professora, com até 30 estudantes”. Esse saldo é considerado um percentual de execução muito baixo, apesar de existir orçamento disponível para a pasta.
O cenário se mostra preocupante por seguir na contramão da “universalização do atendimento escolar”, diretriz do Plano Distrital de Educação (PDE) que estabelece como meta “atender todos aqueles que se encontram na faixa etária de educação obrigatória, de 4 a 17 anos”.
A auditoria do TCDF apontou falhas na oferta de vagas na educação básica obrigatória. Segundo o portal da corte de contas, o problema desigualdades sociais marcadas por território. Por exemplo, “enquanto São Sebastião, Samambaia, Paranoá, Santa Maria e Núcleo Bandeirante têm médias entre 32 e 35 alunos por turma do 7º ao 9º ano, o Plano Piloto tem média de 17 alunos”.
“Nessa etapa de ensino, a Estratégia de Matrículas da SEE/DF define limite de 32 alunos por turma. No ensino médio, cada turma deveria ter no máximo 37 alunos, mas em localidades como São Sebastião há turmas com 41 alunos por sala”, afirma o portal.
Ele acrescenta que, diante desse quadro, não há boas expectativas de soluções com a elaboração do novo Plano de metas a ser estruturado no próximo ano.
“Agora estamos em processo de revisão para um novo PDE, mas a verdade é que as metas do último decênio foram pífias e não foram cumpridas. Durante a pandemia e após esse período, esperávamos novos investimentos na escola pública, mas isso não aconteceu. Muitos estudantes abandonaram a escola e, quando voltaram, estavam mais ansiosos e necessitavam de apoio, mas o investimento não foi feito”, conclui o professor.
Recursos tecnológicos
Embora o Plano Distrital de Educação convencione que até o final de sua vigência as unidades da educação básica deveriam conter laboratório de informática, em aproximadamente 58% das escolas visitadas ele não existia.
“Em 37,5% das escolas, apesar da existência de espaço físico, não havia computadores no local. Além disso, em 70% das escolas que possuíam computadores, as máquinas estavam com problemas técnicos”, destaca o TCDF.
A fiscalização ainda revelou que em mais da metade dos colégios públicos, o acesso à rede de computadores é escasso. “Em 56,4% das escolas o serviço de internet é sustentado com recursos provenientes de rateio entre os próprios profissionais que ali trabalham, uma vez que a rede GDFNet se mostrou insatisfatória em pelo menos 82% das unidades escolares”, registra o Tribunal.
Determinação judicial
Com base no relatório, o Tribunal de Contas determinou que a Secretaria de Educação do DF (SEE/DF) “aperfeiçoe o planejamento da oferta de vagas na rede pública de ensino. A SEE/DF deve considerar os limites máximos de alunos por turma, a capacidade física das escolas e a demanda existente e a reprimida em cada Região Administrativa”.
Para aprimorar a oferta educacional, o TCDF também cobrou da Secretaria a conclusão do Diagnóstico da Infraestrutura Física das escolas e a atualização do Plano de Obras voltado à expansão da rede pública. Com isso, a SEE/DF deverá apresentar um cronograma detalhado de entregas para facilitar o acompanhamento das ações planejadas.
O Brasil de Fato - DF entrou em contato com a Secretaria de Educação do GDF para verificar a existência do cronograma. Apesar de não responderem concretamente sobre esse planejamento, a pasta informou “a auditoria operacional realizada pelo Tribunal foi recebida com atenção e responsabilidade” e que está “empenhada em responder a todos os quesitos levantados dentro dos prazos estipulados pelo TCDF, comprometendo-se a atender às determinações da Corte de forma transparente e em conformidade com as diretrizes estabelecidas”.
Questionário
Para analisar a situação das escolas, o TCDF abriu um canal de ouvidoria aos alunos, pais e responsáveis. Um questionário foi elaborado para coletar opiniões sobre a qualidade dos serviços da Secretaria de Estado da Educação do DF (SEE/DF).
As respostas servirão para orientar futuras fiscalizações do TCDF na área educacional, com um plano de monitoramento previsto para os próximos quatro anos. A consulta está aberta até o dia 15 de novembro.
Com base nos resultados, será possível traçar um cenário mais próximo da realidade da educação pública no DF, identificar os problemas existentes e, desse modo, orientar as fiscalizações do TCDF pelos próximos quatro anos.
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Edição: Rafaela Ferreira